Em apenas 14 minutos, esse vídeo resume o motivo pelo qual a Venezuela decidiu se retirar da OEA. Essa entidade que tem tradição de golpes e conspirações contra países latinoamericanos.
Assistam!
#PorDignidadNosVamosDeOEA
"Se não estás prevenido ante os meios de comunicação, te farão amar o opressor e odiar o oprimido" Malcom X
quinta-feira, 27 de abril de 2017
Golpe na OEA, conspiração contra a Venezuela
terça-feira, 20 de dezembro de 2016
Onde a Globo quer chegar?
por André Araújo
O jornalista Roberto Marinho construiu seu império de comunicações errando pouco e acertando muito. Soube sempre colocar suas fichas nos cavalos certos, poucas vezes apostou mal, por exemplo apoiando a Revolta Paulista de 1932 e desembarcando tardiamente do Governo Militar de 1964 e do Governo Collor.
Roberto Marinho passou a integrar a direção de O GLOBO pela morte do pai em 1925.
Seu período no jornal atravessou as presidências de Arthur Bernardes, Washington Luis, Getulio Vargas (Governo Provisório de 1930, Governo Constitucional de 1934 e Estado Novo de 1937), Eurico Dutra, Getulio novamente, Jango, Governo Parlamentarista de Santiago Dantas e Hermes Lima, Castello Branco, Costa Silva, Junta Militar, Médici, Geisel, Figueiredo, Sarney, Collor e Lula, portanto 18 períodos ou regimes presidenciais, fato raro em qualquer parte do mundo para um dono de jornal.
Apoiou Getulio em 1930, uma jogada arriscada, apoiou o Estado Novo varguista a ponto de fazer parte do Conselho Nacional de Imprensa, órgão do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda). Conseguiu em 1944 sua primeira rádio comprada da RCA Victor. Nas eleições de 1945 e 1950 apoiou a UDN e seu candidato Eduardo Gomes mas se compôs com Dutra e Getulio, este até 1953, quando desembarcou do varguismo. No Governo JK estava discretamente na oposição, posição moderada por ter Juscelino lhe autorizado a primeira TV Globo, campo até então dominado pela TV Tupi de seu inimigo visceral, Assis Chateaubriand, Embaixador de JK em Londres e introdutor da televisão no Brasil.
Errou em dois timings, no desembarque do governo militar e no desembarque do governo Collor.
Com FHC estava às mil maravilhas, com Lula se compôs sem gostar.
A partir das apostas políticas certas, o Sistema GLOBO saiu de um jornal de cidade do terceiro mundo para um dos maiores grupos de mídia do planeta, mas sempre cresceu a partir do timoneiro Roberto Marinho. Sem ele, o jogo mudou e a travessia não é tão segura.
A GLOBO de hoje não tem linha política minimamente definida, parece biruta de aeroporto.
Nos tempos do dr Roberto grandes cérebros ajudavam a dar a linha, amigos pessoais como Roberto Campos e Jorge Serpa, este último conselheiro por 50 anos. Serpa era o Talleyrand brasileiro, redigia os discursos de Goulart (inclusive o fatídico de 13 de março), preso pelos militares conseguiu se passar para o lado deles e tornou-se próximo do regime, redigia muitos editoriais políticos do jornal. Serpa era muito mais que um simples formulador de ideias, era amigo pessoal de Marinho, um dos poucos que era habitué de sua casa de praia nos fins de semana.
Hoje analiso os programas políticos da GLOBONEWS (não vejo a Globo aberta há décadas) e vejo uma parcialidade tosca, banal, caipira, que não havia nos tempos do dr Roberto. Desapareceu completamente a sutileza, a finesse, a sofisticação das análises.
Exemplos: Como a GLOBONEWS apóia cegamente a Lava Jato e todas suas ramificações NÃO há um único contraponto de opiniões. Malham o Congresso de manhã, tarde e noite, especialmente Renan, sem se avergonhar da parcialidade. Hoje no ESTÚDIO I, a frenética Maria Beltrão, a mesma que várias vezes malhou o regime militar do qual seu pai foi importante Ministro, leu e-mails das "redes sociais", todos lidos, sem nenhuma exceção, malhavam Renan. Será que não havia uma ou outra opinião divergente? Não é normal todos os espectadores pensarem igual.
A "tropa de choque" da onipresente Lo Prete, a que horas será que ela dorme e faz refeições?, tem a linha: malhar sem dó o Congresso, elogiar sem nenhum reparo juízes e promotores, aqueles "que fazem a diferença", tudo isso avalizado pelo oráculo Merval Pereira, um personagem de Lima Barreto do começo do século até no bigode português, para o qual o jogo político sob o qual a Globo nasceu e cresceu sempre foi limpo. Daí o espanto com a corrupção de hoje, ele sempre se choca com " isto é um absurdo", tudo que não bate com a visão de mundo dele é um absurdo mas a Globo poupa cuidadosamente o BNDES porque lá tem operações, assim como seus maiores clientes, então deixa quieto.
Quando a Lo Prete deixa o Merval falar, desfila obviedades, platitudes e lugares comuns sempre na linha a favor do Judiciário e contra os políticos, aos quais ele tapa o nariz. Parece que o sonho da Globo é uma Presidência asséptica, descontaminada de políticos, classe pela qual Lo Prete and friends têm horror.
Quanto à economia, a GLOBO apostou desde o inicio na dupla Meirelles-Goldfajn, seus porta vozes (fraquíssimos), Sardenberg e João Borges, desde o início dessa equipe, se postaram avalizando a política a la grega que através da austeridade vai "restabelecer a confiança e fazer voltar os investimentos". Uma imensa asneira cuja ficha só caiu nos últimos quinze dias, deixando Sardenberg, Borges e até a simpática Juliana Rosa no meio da escada.
Porque a GLOBONEWS com todos seus imensos recursos de correspondentes (em geral muito bons) mundo afora não entrevista Joseph Stiglitz, Dani Rodrick, Paul Krugman ouvindo o que eles têm a dizer sobre a crise econômica brasileira? Porque avalizar dois medíocres que não têm três ideias na cabeça e estão levando o país ao fundo do abismo? Afinal, crise derruba o faturamento até das redes de televisão, penso eu. Até agora a GLOBO referendou a recessão, com a fala de Goldfajn de ontem "a fraqueza da economia ajuda a combater a inflação", assim como a morte de pacientes em um hospital público ajuda a economizar na comida dos doentes. Um dito imbecil desses não mereceu o mínimo reparo dos assustados Sardenberg e Borges, sequer comentaram e muito menos fizeram algum reparo, tal qual no cemitério da Consolação depois que fecham os portões não tem inflação.
O maior sábio de economia da GLOBONEWS é Ricardo Amorim, "garoto de mercado" raso como um pires de café expresso, admirador sem reservas da política Meirelles-Goldfajn de austeridade e que escreveu livro mostrando a maravilha que será o Brasil com a nova política econômica da PEC 55. O livro tem um nome sugestivo, APÓS A CRISE. O sarcástico Lucas Mendes, em tom de galhofa lhe cobrou, no último Globonews um "e então nada do que você previu está acontecendo", para profunda irritação de Amorim que disse "acertei todas", por exemplo acertei que Dilma perderia o impeachment.
É esse o nível do jornalismo econômico da Globo. Com todo dinheiro que tem não podiam achar bons cérebros? O Brasil é uma fábrica de bons pensadores econômicos e não precisa ser um fixo, o melhor são comentaristas rotativos como na TV européia ou na TV pública americana. Mas não vi em nenhum programa MANHATTAN CONNECTION um economista de primeira linha dando sua opinião sobre a crise brasileira, por exemplo do Institute for New Economic Thinking, que fica lá mesmo em Nova York e que tem nomes mundiais, Prêmios Nobel como Krugman e Stiglitzs. Se convidados eles irão com o maior prazer. Conversei com alguns deles sobre isso, o programa nem sabe que existe o INET, fórum hoje universalmente conhecido, fundado em 2008 por causa do fracasso das fórmulas monetaristas causadoras da crise, as mesmas fórmulas da dupla Meirelles Goldfajn, a turma do zurro.
Já a inacreditável Mara Luquet tem boas soluções, para os que estão com dívidas nos bancos "você precisa negociar, se o gerente não baixar os juros você atravessa a rua e vá para outro banco". Os aposentados não conseguem manter seus orçamentos? Vá morar na Costa Rica, lá você vive bem com mil dólares por mês, esquecendo que também se vive bem com mil dólares em Caratinga, cidade mineira da Zona da Mata. Fico imaginando um metalúrgico aposentado do ABC, com cinco filhos e nove netos, a sogra, quatro irmãos e cinco cunhadas fazendo mudança para a Costa Rica, seguindo os conselhos da Luquet, afinal lá se vive bem (será numa cabana?).
A última da Luquet é para o imortal Chico Anysio: o desemprego não é culpa da crise, é que o trabalho mudou e você não sabe. Você não precisa mais de emprego, por exemplo, eu tomo muita água de coco, então eu descobri pela internet uma moça que entrega coco em casa, esse vai ser o novo trabalho do mundo, você se vira pela internet, o emprego comum acabou, você em casa pode fabricar aço, pneu, automóvel, inseticida e sair vendendo pela internet, sacou?
Até o razoável programa Painel, o carro chefe de grandes questões da GLOBONEWS não consegue sair de um carnet de vinte nomes repetidos à exaustão. Mas com exceções, como Carlos Mello e Murilo Aragão, muito bons, os outros são todas da mesma linha conservadora moralista, não há a pimenta do debate, parece que a discussão não interessa, só o reforço do que a GLOBO já pensa.
Uma ressalva para a jornalista Monica Waldvogel. Seu programa ENTRE ASPAS tem mantido um nutrido debate sobre os tópicos levados à discussão. No último, com o dinossauro da PUC Rio José Marcio Camargo e um jovem economista da Unicamp, quase se pegaram. Isso tem acontecido em vários programas da Monica, outros programas quase sempre com debatedores com linhas opostas sobre o tema, é preciso elogiar quando é o caso.
Já a lendária Miriam Leitão é um caso a parte. Depois de ouvi-la atentamente por 30 anos não descobri o que ela pensa da vida, da política e da economia. Não tem uma linha conservadora ou contestadora, pode ser uma coisa de manhã e outra à noite. Em política está à esquerda de Frei Betto, em economia está à direita de Milton Friedman, mas às vezes mistura o baralho. Não sei realmente o ponto de vista que ela representa, além do fato de se mostrar sabichona em qualquer assunto.
Uma coisa todos, os e as globetes, têm em comum: o profundo desprezo pelo Brasil, como País, povo, sociedade, política e economia. O sonho global está fora do Brasil, se pudessem se mudariam para Miami. Diego Mainardi é uma espécie de síntese dos globetes, do seu horror pelo País, de sua admiração rastaquera pelo exterior, levaram uma sova, todos, na eleição do Trump, nunca esperavam um tipo desses ser Presidente da adorada terra, agora não sabem como digerir, Trump faz os EUA se parecerem com o Brasil, como fazer?
quarta-feira, 7 de dezembro de 2016
Fidel Castro, invicto e imortal
Foto: Ladyrene Pérez/ Cubadebate |
Por Juliana Medeiros, especial de Havana (Cuba)
Se alguma dúvida havia sobre a gratidão e o respeito dos cubanos por Fidel Castro, as imagens que correram o mundo falam por si.
Mesmo aqueles cubanos críticos ao regime, se incorporaram ao silêncio respeitoso que tomou conta do país desde que o Comandante Raul Castro surgiu em todos os canais na noite de 25 de novembro confirmando a partida de Fidel aos 90 anos de idade.
Para quem conhece Cuba e seus cidadãos, sempre tão alegres e falantes, foi significativo ver o pesar que tomou conta da ilha socialista. Especialmente porque a notícia da morte de Fidel vinha sendo fonte de inúmeros boatos, todos os anos. Polêmico, Fidel de fato sofreu várias tentativas de assassinato e o comentário que mais se houve pelas ruas de Cuba é: "no lograron matarlo, murió invicto".
O destino final do funeral de 9 dias foi Santiago de Cuba, cidade cerca de 800km da capital e local onde Fidel declarou vitoriosa a Revolução e dali, partiu com os muitos guerrilheiros, além de Che Guevara, Camilo Cienfuegos e Raul Castro para Havana onde chegaram em 1º de janeiro de 1959, data que marca o aniversário da Revolução Cubana. Por isso, a comissão organizadora decidiu levá-lo de volta à esse local onde 57 anos atrás, Cuba deu início à um novo capítulo de sua história e segue desde então com seu modelo único de socialismo.
O povo de Santiago de Cuba e inúmeras pessoas de toda parte da ilha e também de vários países continuam prestando tributo ao Comandante em Chefe da Revolução Cubana, Fidel Castro, visitando o cemitério de Santa Efigênia, onde foram depositadas as cinzas de Fidel dentro de um monólito em que há apenas uma placa de bronze com seu primeiro nome, FIDEL.
A cerimônia de inumação foi fechada aos familiares e amigos mais próximos e ocorreu neste último domingo, dia 4. Em seguida, longas filas de mais de 1 km se formaram desde o início da manhã, em torno do Memorial José Martí, onde as pessoas esperavam por horas para poderem render em silêncio sua última homenagem ao comandante.
O comboio que levava as cinzas de Fidel Castro - repetindo o trajeto da Caravana da Liberdade em 1959 - chegou a Santiago de Cuba no sábado, depois de passar por cidades do interior do país ao longo da carretera central da ilha.
No caminho, a multidão esperava por horas, assim que corria a notícia de que a caravana estava se aproximando. Gente de todas as idades, muito emocionadas portando cartazes, fotografias, bandeiras, flores, crianças com singelos desenhos feitos em homenagem ao comandante da Revolução, que partiu deixando um legado de resistência, solidariedade e internacionalismo.
A partida de Fidel Castro surpreendeu os cubanos não só pela reação do próprio país, mas também pela reação mundial e as diferentes homenagens que recebeu e continua recebendo. Líderes de vários países se manifestaram e muitos estiveram em Cuba durante esses dias de homenagens, incluindo Lula e Dilma que foram ao ato de massas na Praça de Santiago de Cuba para a derradeira despedida com milhares de cubanos e estrangeiros.
E não só estrangeiros de todo o mundo não param de chegar em Cuba, como também o Comitê de Imprensa em Havana informou que há mais que o dobro de jornalistas de todo o mundo na ilha, se comparado com os que vieram para a visita de Obama e do Papa.
A embaixadora cubana Ana Silvia Rodriguez também agradeceu as mensagens de solidariedade recebidas de mais de 140 países membros da ONU pela morte de Fidel. A entidade reconheceu a luta do comandante por levar saúde, educação, moradia, transporte e segurança para o seu povo, legados que até hoje fazem de Cuba o país com um dos melhores índices de desenvolvimento, apesar da pressão exercida pelo cruel embargo norte-americano à ilha que prejudica sobremaneira sua economia.
Na última semana, em que o Estado decretou 9 dias de luto nacional, os cubanos puderam reviver em vários momentos, o chamado "Conceito de Revolução", um texto que Fidel apresentou em um de seus famosos discursos na Praça da Revolução. A consigna legitimada por milhares de cubanos, se perpetua como testamento político de Fidel Castro. Essas palavras passaram a ser um juramento, um compromisso com as conquistas da Revolução Cubana. Você as encontra na ilha por todos os lados, em lojas, casas, nas ruas. Está tão inserido na cultura cubana que quando o presidente do Equador, Rafael Correa, começou a ler esse trecho, na Praça da Revolução, os milhares de cubanos que aí estavam o seguiram, repetindo cada palavra.
Esse texto é também uma boa síntese da grandeza de Fidel Castro e daquilo que faz os cubanos serem quem são:
O que é revolução?É a reafirmação dos princípios que construíram essa sociedade especial, de pessoas que deixam suas famílias e saem pelo mundo a lutar por liberdade, justiça, saúde, a distribuírem abraços.
Revolução é o sentido do momento histórico; é mudar tudo o que deve ser mudado; é igualdade e liberdade plenas; é ser tratado e tratar aos demais como seres humanos; é emancipar-nos por nós mesmos e com nossos próprios esforços; é desafiar poderosas forças dominantes dentro e fora do âmbito social e nacional; é defender os valores em que se crê, ao preço de qualquer sacrifício; é modéstia, desinteresse, altruísmo, solidariedade e heroísmo; é lutar com audácia, inteligência e realismo; é não mentir jamais, nem violar princípios éticos; é convicção profunda de que não existe força do mundo capaz de se sobrepor à força da verdade e das ideias. Revolução é unidade, é independência, é lutar por nossos sonhos de justiça para Cuba e para o mundo, que é a base de nosso patriotismo, nosso socialismo e nosso internacionalismo.
Talvez por isso, na noite da última quarta-feira, quando ocorreu o Ato de Massas em Havana, apesar do cansaço e de estarem em pé por horas ouvindo discursos por vezes longos e que em nada se pareciam com aqueles cheios de energia de Fidel, o povo ficou até o fim, ouvindo cada presidente a dizer obrigado, Cuba, por tudo o que fizeram por nós, obrigado Fidel por nos inspirar. Da África, da Ásia, Europa, América, de pequenas ilhas distantes, de países que são quase um continente, todos queriam dizer: obrigado. Por lutar conosco na guerra, por nos enviar seus professores, por treinar nossos atletas, por seus médicos que nos salvam. Pelas palavras de estímulo, pelo compromisso jamais quebrado, pelo exemplo de resistência.
Um dos momentos mais emocionantes foi quando o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, perguntou "¿Donde está Fidel?” E a multidão inteira imediatamente respondeu "¡Aquí!" para logo em seguida começarem a gritar várias vezes "Yo soy Fidel!", uma sinergia impressionante e uma prova de que o comandante segue vivo em cada um dos cidadãos dessa ilha, que é exemplo para o mundo inteiro.
O último a se pronunciar foi Raul Castro que desde 2006, quando Fidel anunciou seu afastamento, conduz a ilha. Um silêncio tomou conta da praça de Santiago de Cuba, de tão embargada a voz e tão fortes as palavras do comandante-irmão, lembrando vários momentos duros nos quais o povo cubano esteve na defesa da revolução junto ao Comandante em Chefe. Memória identitária, gravada na pele de gerações inteiras, representadas naquela praça.
Mais do que um adeus a Fidel, o povo de Cuba, ao longo da carretera central, por onde passou o féretro de seu comandante, disse ao mundo que seguirá adiante e que Fidel Castro segue vivo com eles, tendo transcendido à imortalidade.
A pergunta que muitas emissoras por todo o mundo que estão por aqui, fazem é: o que vai acontecer com Cuba agora que Fidel se foi. O que posso dizer é que, ao menos por enquanto, essa pergunta é respondida pelos cubanos sempre da mesma maneira: "aquí, no pasa nada". Ou seja, Cuba segue tranquila, com os cubanos convictos de que agora é ainda mais importante manter o legado de Fidel Castro.
terça-feira, 15 de novembro de 2016
O mundo e o enigma Trump
Por Roberto Amaral
A ameaça reacionária não é fato nem novo nem isolado, mas agora se instala no cume do poder mundial.
Diante de dois péssimos candidatos, o eleitorado norte-americano, dividido ideologicamente como jamais esteve, escolheu, após campanha do mais baixo nível, aquele que lhe pareceu a negação do establishment, exatamente Donald Trump, figura heterodoxa do sistema (não fôra ele um bilionário de Walt Street), o único ‘não político’, multimilionário desde o berço, outsider na política, devedor do fisco e ao mesmo tempo defensor de menos impostos para os ricos, e militante contra a política de saúde social de seu antecessor.
O 45ª presidente norte-americano, depois de derrotar de forma avassaladora o Partido Republicano e suas lideranças mais conspícuas, impondo-se como candidato contra a vontade da máquina, fez de sua campanha uma plataforma do reacionarismo mais primário, da xenofobia e do protecionismo (uma ameaça não só à União Europeia mas a países como o Brasil, a Índia e a China, entre outros grandes exportadores).
Mas prometeu isolacionismo, o que soa como música aos ouvidos de todos, porque pode ser traduzido como menos intervencionismo político na América Latina (apesar de suas ameaças ao Mexico) e menos invasões militares no resto do mundo. A propósito, nos últimos anos de Bush e Obama, os EUA intervieram e destruíram o Iraque, a Líbia e a Síria, depois de destruírem o Afeganistão, e por essas tragédias estamos todos pagando – enquanto cada vez mais aufere lucros a miserável indústria da guerra.
De outra parte, na disputa dentro do Partido Democrata, a ex-secretária de Estado, que sempre simbolizou o continuísmo (com republicanos ou democratas) era o nome da máquina contra o senador Bernie Sanders, que representava, ele sim, o sentimento de mudança.
A vitória de Trump representa, nas circunstâncias, a derrota do neoliberalismo ortodoxo, da financeirização da economia, a derrota da mídia americana (segundo ele “desonesta e enviesada”) e da mídia mundial, como dos institutos de pesquisa em todo o globo.
Mas o presidente eleito é, ao mesmo tempo, o candidato grotesco que desmoralizou os partidos, a política, seus ritos, seus fins, sua teleologia, reduzindo-a à insignificância da inutilidade. Esse Trump, antes das eleições rejeitado por 59% do eleitorado, candidato populista de extrema-direita que nos lembra uma composição que misturasse Maluf e um Bolsonaro qualquer com uma pitada de Sílvio Santos, não é, porém, obra do acaso, fruto que é da crise política dos EUA, da crise econômica e da crise ética, e de seu sistema político; é a falência do processo eleitoral e da democracia representativa nos EUA, o esgotamento de um ciclo que se encerra sem anunciar novos tempos, senão a promessa de muita apreensão.
É a falência do sistema eleitoral, inepto, como demonstrou a eleição do Bush filho, fundada na fraude e no desrespeito à vontade majoritária, desrespeito que se repete nas pouco representativas eleições deste mês: 231 milhões de eleitores numa população de 320 milhões; 46,9% dos habilitados não votaram; 25,6% votaram em Hillary e 25,5%, em Trump.
A derrotada recebeu 250 mil votos a mais que o vencedor. É a agonia do bipartidarismo, a falência do Partido Democrata, derrotado na política e nas urnas, e a derrota do Partido Republicano, que teve se assimilar um candidato imposto de fora para dentro e com o qual não se identificou na campanha.
Mas essa eleição não pode ficar no grotesco nem pode demonizar o poder da soberania do voto, como querem analistas apressados dos dois lados do Atlântico. Como em nossa crise cabocla, é preciso considerar ingredientes tradicionais como o desemprego, a queda da renda individual, a pauperização das grandes massas (hoje, 46 milhões de norte-americanos dependem do food stamp, o ‘bolsa família’ deles) o endividamento, a moradia precária, a violência e, em país beligerante, permanentemente em guerra, o cansaço ante tantas intervenções e tantas invasões e tantas bases militares cobrindo a Terra.
Além disso, o medo em face do terrorismo difuso, o legado dos 16 anos de Bush-Obama, por seu turno a continuidade política da beligerância de Clinton, sucessor de Bush-pai, herdeiro de Nixon e Reagan, herdeiro de Johnson, herdeiro de Kennedy…
É evidente que está sob comentário fenômeno recente embora há muito anunciado – aguda guinada direitista dos EUA – e qualquer análise não passará de tentativa de antevisão, com todos os riscos inerentes. Se é possível antever o frustrado governo Hillary – preeminência do establishment, do complexo militar-industrial, dos falcões da política externa, do fortalecimento da OTAN e do crescimento das dificuldades com a Rússia e tudo o que de tudo isso é mero desdobramento –, relativamente a Trump qualquer previsão é mais insegura.
Dir-se-á, e apostamos nessa hipótese, que a complexidade do sistema político governante, com seus pesos e contrapesos que promovem o controle social e político, absorvendo as crises – o complexo militar-industrial de que nos falava Eisenhower, o Congresso, Wall Street, o Pentágono, CIA e FBI, a Suprema Corte – estaria vacinada contra aventureiros.
Mas nada disso impediu a loucura democrata no Vietnã nem a irresponsabilidade republicana no Iraque. De outra parte, Trump assume contando com o apoio (que faltou a Obama) tanto da Câmara dos Representantes quanto do Senado (o Partido Republicano renovou sua maioria em ambas as Casas) e com reais possibilidades (preencherá três vagas) de influir na composição da Suprema Corte.
Diz um comentarista nativo que Trump venceu por haver convencido o eleitorado de que era sincero, ou seja, que ele próprio acreditava em suas ideias, mais precisamente nas ideias que expunha como suas.
Ora a questão central é o fato de essas ideias impregnadas de ódio e discriminação(sinceras ou não, bem ou mal transmitidas), haverem encontrado eco nos EUA profundos: o discurso contra os latinos de um modo geral e os mexicanos de forma particular (“Quando o México envia suas pessoas [para os EUA], eles não estão mandando seus melhores […] Eles estão trazendo drogas, crime. São estupradores. […] Eu vou construir um grandioso muro em nossas fronteiras. E vou fazer o México pagar por ele”), o discurso contra os imigrantes de um modo geral (promete expulsar 11 milhões de imigrantes em situação irregular) mas contra os muçulmanos de um modo particular, dos deficientes, dos intelectuais, das mulheres ‘modernas’, pós-feministas e independentes, a ladainha contra aliados políticos e militares dos EUA e da OTAN em especial, as ameaças (por enquanto comerciais) à China, a quem acusa de haver deflagrado uma espécie de guerra econômica contra seu país.
Observe-se, de passagem, que a China, com um caixa de 1,244 trilhão de dólares de títulos da dívida publica dos EUA, é seu principal credor.
Como já foi observado, o problema não é Donald Trump, mas o fato de parcela considerável do eleitorado dos EUA, após quase dois anos de campanha eleitoral, se haverem convencido de que tal personagem podia ser presidente da República.
O problema não é esse personagem, mas a fragilidade do sistema democrático dos EUA que – depois de Reagan e Bush – enseja sua emergência, a partir de uma campanha fundada no ódio, na exclusão, na divisão, na segregação, na política de terra arrasada (para anunciar um novo EUA teve de primeiro decretar a derrocada do atual).
O fato objetivo, desagradável mas real, é que o novo presidente reflete uma sociedade dividida, clivada em seus valores mais profundos, falando mais alto que todos (nas eleições) os valores majoritários do americano branco classe-média, principalmente aquele que vive na América rural, a qual assegurou a Trump vitórias decisivas em Estados chamados “pêndulo” (por indicarem nas eleições uma tendência para a qual se inclinaria o eleitorado nacional), como Flórida, Ohio e Carolina do Norte, ressentido com os efeitos da globalização e da imigração.
Não é fato novo, porém, esse avanço da direita e da extrema-direita em sociedades desenvolvidas: assim marcha a política na Alemanha, na Polônia, na França, na Áustria, na Hungria, na Turquia e no Reino Unido, de que constitui eloquente sintoma a rejeição inglesa à Comunidade Europeia, como símbolo de unificação e globalização. Em ambos os casos, nas vitórias de Trump e do Brexit, houve a clara derrota das elites locais.
Mesmo entre nós, inclusive na América do Sul (a eleição de Macri, na Argentina, o “não” ao acordo de Paz na Colômbia, a crise na Venezuela) e no Brasil, essa ameaça reacionária não é fato nem novo nem isolado. E agora se instala no cume do poder político mundial, do poder econômico e do poder militar (tudo isso ao mesmo tempo), compreendendo o controle do mais poderoso arsenal atômico jamais conhecido pela humanidade.
Não é, pois, uma ameaça trivial. A questão não é Donald Trump, mas os EUA que estão emergindo desse 8 de novembro (o resultado chocante veio a lume em 9/11 o que sugere um curioso, e um tanto sinistro, espelhamento com o 11/9).
Donald Trump, porém, na presidência, poderá ser algo diverso do candidato grotesco, e dessa metamorfose já deu sinais em seu discurso logo após o reconhecimento da eleição. Metade dele foi de uma frivolidade e de um vazio dolorosos. Outra é ambígua: ele faz o discurso conciliatório de todo vencedor (e não menos de alguém preocupado com o bom funcionamento dos mercados), mas ao mesmo tempo cria imagens de reconstrução de um pais devastado. Poderá mesmo ser um acelerador do processo histórico, acentuado contradições.
Há ainda pouco indicadores de como será Donald Trump instalado no salão oval da Casa Branca, aí então à mercê de suas circunstâncias.
Por enquanto, um enigma.
Roberto Amaral é escritor e ex-ministro de Ciência e Tecnologia
segunda-feira, 4 de julho de 2016
ENTREVISTA COM EUGÊNIO ARAGÃO
Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil / Fotos Públicas (01.07.2016) |