"Se não estás prevenido ante os meios de comunicação, te farão amar o opressor e odiar o oprimido" Malcom X

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Para um Ano realmente Novo

Aos amigos, familiares, camaradas.

Que 2011 chegue com muita saúde, paz, amor e percepção. Obrigada a todos os seres que - direta ou indiretamente - contribuíram esse ano para que eu comesse, me vestisse, vivesse enfim. Que  Budha nos ilumine o caminho para a Terra Pura. O texto abaixo, do poeta Drummond, é quase uma reflexão budista sobre a responsabilidade que reside apenas em nós.

Namandabu
Juliana MSC



Receita de ano novo

Por Carlos Drummond de Andrade



Para você ganhar belíssimo Ano Novo 
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz, 
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido 
(mal vivido talvez ou sem sentido) 
para você ganhar um ano 
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras, 
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser; 
novo 
até no coração das coisas menos percebidas 
(a começar pelo seu interior) 
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota, 
mas com ele se come, se passeia, 
se ama, se compreende, se trabalha, 
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita, 
não precisa expedir nem receber mensagens 
(planta recebe mensagens? 
passa telegramas?) 



Não precisa 
fazer lista de boas intenções 
para arquivá-las na gaveta. 
Não precisa chorar arrependido 
pelas besteiras consumidas 
nem parvamente acreditar 
que por decreto de esperança 
a partir de janeiro as coisas mudem 
e seja tudo claridade, recompensa, 
justiça entre os homens e as nações, 
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal, 
direitos respeitados, começando 
pelo direito augusto de viver. 



Para ganhar um Ano Novo 
que mereça este nome, 
você, meu caro, tem de merecê-lo, 
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil, 
mas tente, experimente, consciente. 
É dentro de você que o Ano Novo 
cochila e espera desde sempre.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Para os ecochatos

Acho que há muito tempo não ficava tão feliz com uma notícia. No último final de semana fui surpreendida por uma reação, no mínimo histérica, de uma conhecida ao me ouvir relatar a prática que tenho em minha casa de separar o lixo. Nas palavras dela, somente gente como eu que "vive no mundo da fantasia perde tempo com esse tipo de coisa". Essas e outras palavras de cunho ofensivo se somaram a outras, de que isso é coisa de "ecochatos" e de quem "se acha socialista" mas "não quer dividir o próprio salário", dentre outras baboseiras, fruto da desinformação geral, reforçada pelo bombardeio midiático cujo poder de distorcer a realidade, conhecemos bem.

Costumo dizer que minhas convicções políticas são somente minhas e nunca me dediquei em convencer as pessoas do que acredito, eu apenas faço. Se sou socialista, flamenguista, ambientalista, vegetariana, humanista, se acredito na força do poder popular ou na capacidade humana de fazer o bem (na mesma medida em que é capaz de fazer o mal), tudo isso é problema meu. Não costumo perder muito tempo em discussões que não darão em nada, ainda que eu admita que adoro um debate, mas somente com quem vale a pena (e não são todas as pessoas com quem se vale a pena debater ou que tenham algo para trocar).

Talvez por falta de paciência, mas o fato é que acredito que as pessoas precisam ter a mesma convicção, algo muito próximo do conjunto de valores que nos formam. Simplesmente acho que não posso convencer ninguém do que acredito, ainda que possa lutar para que aceitem isso (institucionalmente falando). No caso, parece que mais uma vez o tempo vencerá a questão.

A notícia abaixo estava no site do Estadão e eu, que acompanhei tanto tempo o desenrolar dessa lei, não vi que a publicação no DO foi na última quinta-feira. Ainda assim, estou absolutamente feliz em saber que mais um monte de gente vive no mesmo "mundo da fantasia" que eu e, ainda que com atraso de décadas, conseguiram fazer com que, doendo no bolso, as pessoas sejam obrigadas a se enquadrarem em algo que servirá para melhorar a vida de todos, até mesmo dos resistentes às mudanças. Sei que ainda serão alguns anos até que todos os envolvidos - cidadãos, condomínios, entidades - estejam adaptados, mas isso faz parte. Foi assim quando começaram a aplicar o plano de educação no trânsito em Brasília que hoje - mesmo com todos os problemas - é modelo em todo o país. Com certeza houve, naquela época, quem considerasse "ridículo" ser obrigado a parar na faixa de pedestres, atitude que hoje, para todos que vivem na capital, é tão natural quanto escovar os dentes. 

Para minha conhecida que me perguntou o que era "esse socialismo que gente como eu" insistia em acreditar, ou que era coisa de gente "ecochata que não tem o que fazer", acho que essa pode ser uma das muitas respostas possíveis.

A matéria pode ser lida, na íntegra, no Estadão. A primeira parte dela está abaixo:


Lei prevê multa para quem não separar lixo doméstico

Os consumidores que não separarem o lixo seco do úmido estarão sujeitos a multas, segundo decreto publicado na quinta-feira no Diário Oficial. O texto regulamenta a Política Nacional de Resíduos Sólidos, que trata da destinação adequada do lixo no País.
Entre outras medidas, o decreto prevê penalidades para aqueles que não cumprirem as obrigações estabelecidas na coleta seletiva e nos sistemas de logística reversa, pelo qual aparelhos eletroeletrônicos, pilhas e pneus terão de retornar aos fabricantes. A punição pode vir em forma de advertência e, em caso de reincidência, multas de R$ 50 a R$ 500 que poderão ser convertidas em "serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente".
Também estão previstas multas entre R$ 5 mil e R$ 50 milhões para infrações ambientais, como o lançamento de resíduos sólidos em praias. Para a importação de resíduos perigosos, os valores chegam a R$ 10 milhões.
Sancionada em agosto pelo presidente Lula, a lei prevê a substituição dos lixões por aterros sanitários; a criação de planos municipais, estaduais e federal para a gestão dos resíduos; e o incentivo a linhas de financiamento de cooperativas, que devem auxiliar a coleta seletiva e a logística reversa de produtos.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Professor, posso falar?

Esse texto está no blog do Gonzum, mas merece ser reproduzido. 


Buscar a conciliação me parece o mais sensato a fazer agora. Essa brigalhada na web gerou muita energia negativa e desagregou a blogosfera progressista. É ingenuidade, porém, querer encerrar a polêmica através de um silêncio forçado, uma paz artificial. Os assuntos precisam ser debatidos até o fim. Em seuúltimo post sobre o tema, o Idelber adotou posições das quais continuo discordando, e faço-o aqui com a maior educação e respeito, para expandir o debate e tentar, como se diz, fazer desse limão uma limonada.
O texto de Idelber, com toda sua pompa, faz uma série de generalizações rasas. Ele usa a reação de alguns comentaristas de seu blog como exemplo, além das observações de botequim de uma amiga, para fazer um julgamento absolutamente empírico sobre todos os homens do planeta Terra, acusando-os por sua vez de emitir opiniões empíricas e rasas sobre o feminismo. Ou seja, ele pode fazer um julgamento empírico, os “homens” não.
Confiram trecho:
(…) quando homens emitem “opiniões” sobre o feminismo, elas não costumam vir embasadas em bibliografia ou sequer em escuta da experiência das mulheres narrada por elas próprias. Arma-se alguma capenga simetria entre machismo e feminismo, decreta-se que “as” feministas são isso ou aquilo e encerra-se o assunto sob viseiras, em geral acompanhado de algum choramingo contra “elas”, que são “radicais” ou “patrulheiras” (confesso que “barraqueira” eu ouvi pela primeira vez esta semana), sem que nenhum esforço tenha sido despendido na escuta do outro, neste caso na escuta da outra. Note-se, por favor (já que malentendido, teu nome é Internet), que não me refiro a uma opinião sobre tal ou qual leitura feminista de tal ou qual texto de Clarice Lispector, mas às emissões de “opinião” sobre o que “é” o feminismo. Essas, invariavelmente, são um desastre.
A que homens se refere? A que opiniões? Por que opiniões vem entre aspas? Quando eu emito uma opinião sobre um assunto político eu tenho que obrigatoriamente me embasar na bibliografia citada pelo interlocutor? Idelber parece confundir debate político (e feminismo é uma questão política, e das mais populares, não há sentido compará-la ao estudo da “hermenêutica” ou “fenomenologia”) com a formulação de uma tese acadêmica.
Essa postura (equivocada, a meu ver) será aprofundada nos parágrafos seguintes:
Essa prática sempre me pareceu espantosa, porque ninguém, nem mesmo um daqueles jornalistas mais caras-de-pau de MOSCOU, se arriscaria a ter “opinião” sobre, digamos, fenomenologia ou hermenêutica sem antes equipar-se minimamente para tanto. Todavia, sobre o feminismo, uma constelação de pensamentos, escritas e práticas políticas das mulheres não menos complexa, multifacetada, ampla e profunda que aquelas duas escolas, e sem dúvida mais influente que ambas, os homens, em geral, e com visível desconforto e pressa, acham que podem ter “opinião”, passar juízo, assim, sem mais nem menos, sem sequer dar um checada nas estatísticas de violência doméstica, estupro ou diferença salarial entre homens e mulheres ou ouvir uma feminista. Não falemos de ler alguma coisa de bibliografia, uma Beauvoir ou Muraro básica que seja. Acreditam sincera e piamente que essa sua atitude não tem nada a ver com o machismo.
Quem os homens pensam que são para ousar ter opinião (que vem novamente entre aspas; eu queria saber por que vem entre aspas, que têm uma função neste caso notoriamente pejorativa)? Sobre checar as estatísticas de violência doméstica, etc, ou ouvir uma feminista, Idelber novamente generaliza: ele cria um personagem caricatural, que não tem noção de nada, que nunca leu uma notícia sobre violência doméstica nem sobre diferença salarial, que nunca conversou ou ouviu uma feminista, e pespega essa imagem em todo homem que tem opinião (com aspas). Daí ele nos brinda com uma condescendência paternal, abordando novamente a não leitura do cânone feminista. Ora, me desculpe, mas para mim isso é pedantismo puro e descarado, na pior acepção do termo, pois um intelectual que se preza deveria nos trazer ao menos uma síntese, ou resumo, de alguns conceitos contidos naqueles livros. É assim que se produz cultura. É assim que se instiga as pessoas a procurarem os livros mencionados.
Não acho democrático que, diante de um tema político (e popular, repito, não posso conceber que se compare o tema “feminismo” com o estudo da fenomenologia alemã do século XIX), se exija do interlocutor a leitura de uma determinada obra como pré-condição para participar do debate. Se a pessoa acha essa obra tão fundamental, que exponha, então, os seus principais conceitos.
A atitude de Idelber nada mais é do que uma “carteirada” acadêmica. Ele cria um interlocutor imaginário, uma figura caricata, que ele se empenha em detonar. Ao não pessoalizar o ataque, contudo, ele parece estar dando socos intelectuais num boneco de ar, que não pode responder, e ao mesmo tempo posa de campeão de boxe.
Que eu saiba, existem zilhões de livros no mundo e acho impossível alguém lê-los todos. Pior, lembrar deles. Schopenhauer tinha uma frase engraçada sobre isso: dizia que pretender guardar tudo o que se lê na memória corresponderia a segurar no estômago tudo que se comeu ao longo da vida. Ou seja, o sujeito pode ter lido Simone de Beauvoir há vinte anos e hoje não se lembrar de nada, de maneira que para participar do debate sobre feminismo, teria que não apenas ler os livros mencionados, como relê-los, anotá-los, estudá-los detidamente para depois fazer a prova no blog do Idelber.
Essas exigências todas, a meu ver, transformariam o debate feminista numa conversa incrivelmente restrita, uma panelinha acadêmica, mesmo entre as mulheres. Trata-se de uma visão antidemocrática, elitista, e também profundamente antifilosófica, pois inibe o diálogo e a participação de quem não seria “iniciado” nas teorias do “feminismo”.
Mesmo sem leitura nenhuma no assunto, creio que qualquer pessoa tem potencial para dar uma contribuição criativa, a partir de sua experiência pessoal. Você não percebe, Idelber, que seus critérios produziriam uma hierarquia absurda, inclusive e sobretudo entre as próprias mulheres? Haveria uma categoria de sábios ou sábias que se arvorariam donos da verdade na questão do “feminismo”, por terem lido esses livros. Mas quem garante que esses livros não contém uma série de conceitos equivocados? Quer dizer, entendo que existe um feminismo enquanto tese acadêmica ou ciência, mas existe sobretudo, a experiência viva de todo ser humano diante da condição da mulher no mundo. E o homem deve ser estimulado a falar, a dar uma opinião franca e espontânea sobre o tema, e não ser censurado e intimidado como se pretende em seu blog.
Ele continua assim:
Quando esses homens são confrontados por uma feminista, seja em sua ignorância, seja em sua cumplicidade com uma ordem de coisas opressora para as mulheres, armam um chororô de mastodônticas proporções, pobres coitados, tão patrulhados que são. Todos aqueles olhos roxos, discriminações, assédios sexuais, assassinatos, estupros, incluindo-se estupros “corretivos” de lésbicas (via Vange), objetificações para o prazer único do outro, estereotipia na mídia, jornadas duplas de trabalho, espancamentos domésticos? Que nada! Sofrimento mesmo é o de macho “patrulhado” ou “linchado” por feministas! A coisa chega a ser cômica, de tão constrangedora.
Idelber faz insinuações, por mais melífluas que sejam, ao post anterior, onde eu figurei como um dos debatedores. Ele continua batendo no boneco de ar, mas na sua imaginação (e na dos leitores), os rostos ali projetados são de pessoas conhecidas, que não são dignas, porém, de serem nomeadas. Não é da gente que ele está falando. O que ele chama de chororô é a reclamação que fizemos de que nossas intervenções não foram respondidas com argumentos, e sim com respostas evasivas, esnobes, além de criativas variações em torno da palavra “ignorante”. Além de não podemos falar de feminismo sem antes ler os livros da estante do Idelber, temos que aguentar calados que nos esculachem. Noto ainda uma visão “machista” do homem, pois ele dá a entender que não podemos ter sensibilidade, não podemos nos sentir ofendidos, não podemos chorar.
Desfila-se todo o rosário dos melhores momentos do sexista: como posso ser machista se tenho mãe, mulher e filha, como posso ser machista se quem passa minhas roupas é uma mulher, como posso ser machista se de vez em quando ‘divido’ o serviço doméstico com ela, como podem considerar o feminismo um elogio se o machismo é um insulto, por que as feministas ficam nos dividindo, por que as feministas ficam sendo radicais demais e a longa lista de etecéteras bem conhecida das mulheres que têm um histórico de discussão do tema. Os caras sequer são capazes de renovar os emblemas frasais de sua ignorância.
No meu egocentrismo paranóico, senti aquele “rosário” como mais alfinetada em minha pessoa. Agora não apenas sou machista, como também sexista. Maravilha. E usa a tática recorrente de outros comentaristas do seu post anterior, sobre a qual protestamos reiteradamente. Só faltou botar aspas, como fez a outra, para nosso pensamento. Ninguém falou isso que Idelber disse. Ele novamente está batendo num joão-bobo. Eu, por exemplo, dei o exemplo de minha mulher não para vir ao debate com o argumento infantil: “tá vendo? minha mulher concorda comigo”, mas porque minha opinião vinha sendo sistematicamente discriminada pelo fato d’eu ser homem, a ponto de sequer ter o direito de ser chamado de “homem”. A interlocutora (para ser mais preciso, a senhora Lola), passou a nos chamar simplesmente de “machos”, o que, já disse, considerei ofensivo naquele contexto. Nunca me passaria pela cabeça chamá-la de “fêmea”. O que eu quis dizer, e creio que expliquei direitinho, mas se recusaram a entender, é que minha mulher é, na minha opinião, uma feminista. Ela faz uma revista voltada (ao menos nos seus primeiros números) para o público feminino, uma revista que luta abertamente em prol da autoestima e da valorização da mulher. Mas ela também luta contra esse feminismo pedante, acadêmico e agressivo, que, na opinião dela, apenas atrapalha a vida pessoal da mulher e gera estereótipos negativos e contraproducentes para o feminismo.
Quando eu falo em agressividade, não é porque peço um feminismo “dócil”. Não peço nada. Apenas contesto uma maneira de debate fundamentada em acusações de que o outro é ignorante, sem que o interlocutor se disponha a formular sequer UM conceito criativo. Aliás, ainda tem isso, essa falta de criatividade, esse pendurar-se em pensamentos alheios, em conceitos criados nos Estados Unidos há trinta anos, sem atualizá-los à luz dos novos tempos e da realidade brasileira.
Continuando, Idelber aprofunda a generalização e transforma um debate que nem é mais tanto sobre o feminismo, mas que se torna quase um debate sobre a liberdade de expressão, numa crítica abstrata e superficial aos “blogueiros progressistas”.
Foi o caso, nestes últimos dias, de alguns dos blogueiros autoidentificados, a partir de um encontro recente em São Paulo, como “progressistas” (não está muito claro de onde vem nem para onde vai esse “progresso” nem em que consiste o “progredir”, mas é evidente que sou ferrenho defensor da primazia da autoidentificação: que cada um se chame como gosta, contanto que me incluam fora desta; este é um blog de esquerda). O progressismo blogueiro é visivelmente masculinista, e que ele reaja com tão ruidosa choradeira ao mero aflorar de uma crítica feminista é só mais uma óbvia confirmação do fato.
Idelber resolveu implicar com o termo “progressista”, uma preocupação que semelha a busca frenética de pêlos em ovo. Ora, e “esquerda”, não é um termo etimologicamente muito mais estranho? Esquerda também é um termo “resolvido”? Até entendo que ele queira criticar o termo “progressista”, mas a maneira como ele o faz, no contexto da luta política que vivemos, e da posição que ele, Idelber, tem assumido, é desagregadora e desleal. Ora, o termo “progressista” é um tema em aberto. O importante não é tanto o nome do personagem, mas a sua ação, o que ele faz, o que ele pensa. Sobre esse “visivelmente masculinista”, é uma acusação ou qualificação puramente pernóstica. Mais que isso, é enfadonho, como se alguém quisesse desqualificar a revolução francesa por ter sido liderada por homens. É um feminismo barato. Esse sim, a meu ver, é o pior tipo de sexismo. Idelber insinua, por acaso, que os blogueiros progressistas “vetam” deliberadamente a participação de mulheres no movimento? O Encontro Nacional trouxe um enorme número de mulheres. Claro, os blogueiros “grandes” são homens, e certamente pode-se encontrar em toda parte alguma espécie de machismo. Mas é um processo. As mulheres estão ganhando participação e esse tipo de divisionismo sexual, essa tentativa de criar uma guerra entre os sexos, me parece profundamente antipático.
Aí o post sai do estágio do pedantismo e envereda para o da arrogância pura:
Uma das características do masculinismo progressista é sua tremenda dificuldade em entender a lição de Ana que, escrita num contexto de discussão do racismo, também se aplica aqui: não é sobre você que devemos falar. Não é sobre seu umbiguismo, não é sobre seu desconforto, não é sobre a sua necessidade de que as feministas sejam dóceis (ou não “divisionistas”) o suficiente para que possam carimbar e avalizar o seu tranquilizador atestado de boa consciência. Pra isso o Biscoito Fino e a Massa recomenda outra coisa: psicanálise freudiana. No Brasil de Lula e Dilma, já não é coisa tão cara, pelo menos para a maioria dos que leem esta bodega.
Ã? Masculinismo progressista? O que é isso? O que o caracteriza é não entender a lição de “Ana”? Para sermos alguém na vida e nos libertamos de nossos terríveis preconceitos machistas, bastar-nos-á então ler os textos gentilmente indicados por Idelber? No caso, nem é um texto sobre feminismo, é sobre racismo. Daqui a pouco, Idelber vai dizer que os “blogueiros progressistas” são racistas… Aliás, inúmeros comentaristas nessa polêmica insinuaram isso, ao mencionar blogueiros homens-brancos, sem sequer se preocupar em saber que boa parte de nós, blogueiros progressistas, somos pardos e negros. Idelber menciona também o “umbiguismo”, dando vazão ao que eu considero uma discriminação contra uma maneira de escrever, que eu gosto muito, que é de fundamentar conceitos a partir do que conhecemos de nós mesmos. Eu particularmente acho mais honesto e científico basear-se na minha experiência pessoal, no meu umbigo, do que, num debate sobre liberdade de expessão, discorrer sobre as mulheres negras de Uganda. Sobre a análise freudiana, parece-me um ótimo conselho, mas para o próprio autor.
O texto prossegue com xaropadas sobre sexismo, acusando os homens – reles homens! – de cometer a petulância de organizar um movimento na blogosfera! A linguagem de Idelber assusta. Ele conclui com uma espécie de carteirada final, ao dizer que: “Pessoalmente, sou fã da polêmica que se dá entre as feministas materialistas britânicas, em que uma teoria mais funcionalista das relações entre opressão de classe e opressão de gênero se enfrenta com uma teoria entitulada “sistemas duais”, que argumentava pela independência relativa entre capitalismo e patriarcado (embate sociológico dos bons, nos quais nunca, claro, se fixa uma conclusão, mas durante os quais se exploram hipóteses interessantes).”
Bem, eu imagino que essa polêmica aí das feministas materialistas britânicas deve ser algo tremendamente emocionante, mas neste caso, eu prefiro continuar sendo um ignorante.
Por fim, a pérola derradeira do grande Idelber:
Ninguém é obrigado a ser inteligente o tempo todo, mas quando se trata de aprender a escutar, humildade e decência costumam ser as duas qualidades mais importantes da trinca.
Bem, essa aí é fácil responder: basta mandar a bola de volta para quem chutou. Escutar pessoas, homens ou não, que não são expertise em feminismo materialista britânico dual, mas que tem outras experiências de vida interessantes, também seria saudável para Idelber e companhia.
PS: Não quis ofender ninguém ao usar os termos “pedante” ou “arrogante”, mas um debate fica insuportavelmente chato se a gente não puder ter a liberdade de cutucar o interlocutor.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Blog do João Villaverde: O aborto, em uma frase


"Quem aqui não teve uma namoradinha que precisou abortar? Meus amigos, vamos encarar a vida como ela é." Sergio Cabral, governador do Rio de Janeiro, ontem, durante evento com empresários.



Update do post (eu estava sem palavras, mas quero comentar a frase acima):

Justamente agora há pouco - antes de ler essa frase no blog do João - conversava com uma amiga e colega de trabalho sobre o comportamento machista de algumas mulheres que corroboram argumentos que tentam justificar atitudes bárbaras como as do goleiro Bruno contra a mãe do filho dele. Inaceitável. Mas a verdade é que todos nós já presenciamos homens e mulheres dizendo coisas como "ela deve ter feito alguma coisa, provocado..." argumentos que, para mim, não cabem em qualquer sociedade civilizada.

E essa amiga lembrou o gesto recente do Ronaldo (Fenômeno) demonstrando o oposto, segurando um menino no colo, se reconhecendo nele e dizendo "acho que é meu mesmo, nem precisa de DNA". O cara tem grana e sabe que as mulheres podem engravidar e que isso não é somente responsabilidade delas até porque, para começar, o óbvio: ele produziu junto com ela a criança.

E ele sabe que não precisa se casar com a mãe do menino, nem olhar para a cara dela ele precisa. Mas segurar a mão da criança que ele também pariu e dizer que ele se responsabiliza por sua existência.. isso é grandeza, isso é ser homem, é ser gente. Tenho que dizer que passei a admirar ainda mais o atleta que já tantas vezes nos emocionou em campo.

A Lei Maria da Penha - ao contrário do que alguns querem fazer crer - não surgiu do nada, de uma cartola mágica. Ela é fruto de muitos e muitos anos de luta dos movimentos sociais, da observação (da sociedade e instituições, inclusive o judiciário), de inúmeras Conferências de Direitos Humanos e de mulheres Brasil afora, de pesquisas acadêmicas e estatísticas de segurança pública, dentre outros fatores que comprovaram sua urgência (e até atraso em ser criada) e a compreensão de que até mesmo as agressões psicológicas são fruto de uma energia masculina e brutalizada, que na maioria esmagadora das vezes, é produzida por homens contra as mulheres.

Enfim, estou chocada e revoltada com a declaração desse senhor, um agente público, eleito que representa uma parcela da sociedade e que se acha no direito de fazer uma declaração dessas, que por si só é também uma violência. E mais triste ainda é  imaginar que, possivelmente, muitas mulheres também vão defender essa tese.

Update 2:
Só para constar (porque recebi e-mails sobre o assunto): eu sou A FAVOR da legalização do aborto, porque defendo que as mulheres não devem ser criminalizadas por isso e porque acredito que o aborto deve ser enquadrado como política pública. Mas uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. 

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Encontro do MST

Como se informa(?) o cidadão brasileiro

Do BlogueDoSouza:

A Secretaria de Comunicação (Secom) da Presidência da República realizou pesquisa sobre os hábitos de informação dos brasileiros, ouvindo 12 mil pessoas em todas as Unidades da Federação, por meio de entrevistas pessoais, domiciliares. As entrevistas foram feitas no mês de março e divulgadas na semana passada.

Destacamos alguns achados da sondagem feita pela Secom:

Jornal aos domingos – 46,1% dos entrevistados leem jornal. Entre essas pessoas, 24,7% têm o hábito de ler jornal todos os dias e 30,4%, o fazem apenas um dia na semana (42,3% deles aos domingos e 30,6% às segundas);

Revistas – 34,9% leem revistas (esse índice varia entre 39,4% no Sudeste e 29,4% na região Norte);

A rainha do lar, a TV – 96,6% veem TV.
Desses, 83,5% assistem a canais de TV aberta. Entre esses telespectadores, 37% assistem à TV por um período de 2 a 4 horas diárias. Para 64,6% desses brasileiros telespectadores, o telejornal é o programa mais importante da TV, para 16,4%, são as novelas. Entre esses brasileiros, 65,8% preferem a TV Globo e 13%, a Record.
Entre as pessoas que assistem à TV, 56,4% costumam ver o Jornal Nacional e 7,4%, o Jornal da Record.

Entre os espectadores do Jornal Nacional, 27,4% dizem escolher o telejornal porque a emissora é confiável e 23,3% porque identificam-se com a notícia. Entre os que assistem ao Jornal da Record, 26,6% identificam-se com a notícia e 26,5% afirmam que a emissora é confiável. Uma característica importante de diferenciação entre os jornais (embora não possa se desconsiderar o tamanho distinto do universo desses espectadores) é a avaliação da linguagem do telejornal. Para 18,7% das pessoas que assistem ao Jornal Nacional, o telejornal tem linguagem simples. Entre os espectadores do Jornal da Record, esse índice sobe para 23,3%.

Música em qualquer lugar, o rádio – Dos brasileiros ouvidos para a pesquisa, 80,3% ouvem rádio. Desses, 35,9% o fazem todos os dias. As pessoas buscam o rádio principalmente para ouvir música (68,9% dos que ouvem rádio) e, num segundo lugar distante, para ouvir noticiários (17,6%). Fenômeno recente, mas fiel ao espírito móvel do rádio, 17,6% das pessoas que ouvem rádio o fazem por seus aparelhos de telefonia celular.
A rede mundial – Dos brasileiros ouvidos para a pesquisa da Secom, 46,1% acessam a internet. Embora o acesso à rede venha se democratizando, há ainda concentrações importantes, tanto entre os jovens até 25 anos quanto entre as pessoas de maior renda. Entre os brasileiros com renda acima de 10 salários mínimos, o índice de acesso salta para 79,9%.

A internet é utilizada principalmente para lazer (uso principal para 46,3% dos internautas) e, depois, para informação (24,8% dos usuários). Entre os internautas, 47,7% usam a rede para ler jornais e blogs. Os sites mais acessados são o Google (71,6% das menções), Orkut (65,4%) e o serviço de mensagens MSN (64,7%).

Credibilidade – A credibilidade dos meios de comunicação não é grande. Do total de entrevistados, 72,1% acreditam muito pouco nos meios de comunicação, e outros 7,9% não acreditam. Afirmaram acreditar muito nestes meios 18,8%.
Para 57,3% dos entrevistados, as notícias veiculadas pela mídia são tendenciosas. Esse índice varia de 49,3% entre os cidadãos do Nordeste e 64,1% no Centro-Oeste.

Notícias mais interessantes – As notícias consideradas mais interessantes pela população brasileira referem-se aos assuntos sociais (54,3%). Elevado percentual também foi encontrado (52,1%) na manifestação de interesse em notícias sobre programas e benefícios do Governo Federal à população. Notícias sobre economia constituem foco de interesse de 47,8% dos entrevistados, enquanto os assuntos políticos despertam interesse de apenas 32,5%.

Nível de informação – Parcela expressiva da população brasileira se considera pouco informada (48,3%). Apenas 6,4% disseram que se consideram muito informados, enquanto que 44,8% se consideram pessoas informadas.

Recebendo informações e trocando opiniões – As lideranças comunitárias constituem fontes de informação sobre o que está ocorrendo para 15% dos entrevistados. Destes, 49,6% não acreditam que as informações obtidas junto a essas lideranças sejam mais esclarecedoras que aquelas obtidas junto aos meios de comunicação, enquanto 45,6% confiam mais nas informações fornecidas pelas lideranças.
Para 66,3% das pessoas, a TV é o meio mais importante para se buscar informação.
62,9% admitiram que, algumas vezes, mudam seus pontos de vista a partir de informações transmitidas pelos meios de comunicação. Por outro lado, 26,5% nunca mudam seus pontos de vista em função das informações transmitidas pelos meios de comunicação.

Notícias do governo – Entre os entrevistados pela pesquisa, os que veem TV ou leem jornal são os que mais acompanham as notícias sobre o governo federal. Entre os que veem TV, 60,8% acompanham tais notícias e entre os leitores de jornal, esse índice é de 60,3%. O percentual de acompanhamento de notícias sobre o Governo Federal é relativamente menor na Internet: apenas 23,5% dos internautas admitiram acompanhar notícias sobre o Governo Federal na rede. O percentual de pessoas que acessam sites do Governo regularmente para buscar informações corresponde a 6,0%. Eventualmente, 14,3% dos internautas admitiram acessar sites do governo para obter informações, totalizando 20,3% que acessam sites do governo.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Jornalismo 1 x 0 Gilmar Mendes

Do blog do Leandro Fortes

Na edição de 8 de outubro de 2008 da CartaCapital, em uma reportagem de minha autoria intitulada “O empresário Gilmar Mendes”, revelei a ligação societária entre o então presidente do Supremo Tribunal Federal e o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Trata-se de uma escola de cursinhos de direito cujo prédio foi construído com dinheiro do Banco do Brasil sobre um terreno, localizado em área nobre de Brasília, praticamente doado (80% de desconto) a Mendes pelo ex-governador do Distrito Federal Joaquim Roriz. O IDP, à época da matéria, havia fechado 2,4 milhões em contratos sem licitação com órgãos federais, tribunais e entidades da magistratura, volume de dinheiro que havia sido sensivelmente turbinado depois da ida de Mendes para o STF, por indicação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. O corpo docente do IDP era formado, basicamente, por ministros de Estado e de tribunais superiores, desembargadores e advogados com interesses diretos em processos no Supremo, o que, por si só, já era passível de uma investigação jornalística decente. O que, aliás, foi feito pela CartaCapital quando toda a imprensa restante, ou se calava, ou fazia as vontades do ministro em questão. Foi a época da Operação Satiagraha, dos dois habeas corpus concedidos por Mendes ao banqueiro Daniel Dantas, em menos de 48 horas. Em seguida, a mídia encampou a farsa do grampo sem áudio, publicado pela revista Veja, que serviu para afastar da Agência Brasileira de Inteligência o delegado Paulo Lacerda, com o auxílio luxuoso do ministro da Defesa, Nelson Jobim, autor de uma falsa denúncia sobre existência de equipamentos secretos de escuta telefônica que teriam sido adquiridos pela Abin.
Naqueles tempos duros, fazer uma cobertura crítica da atuação de Gilmar Mendes no STF era uma tarefa quase suicida. Mesmo o governo federal, instado a não comprar briga com Mendes justo no momento em que o inquérito do chamado “mensalão” passava às barras do Supremo, manteve-se amedrontado. Emblema daquela circunstância foi a submissão do presidente Lula às idiossincrasias de Mendes, chamado pelo ministro “às falas” para responder pela inverossímil denúncia de espionagem no STF. CartaCapital e este repórter, por revelarem as atividades comerciais paralelas de Gilmar Mendes, acabaram processados pelo ministro, evidencie-se, dentro das regras democráticas e legais do Estado de direito.
Acusou-nos, Mendes, de termos elaborado a referida reportagem com o intuito de lhe “denegrir a imagem” e “macular sua credibilidade”. Alegou, ainda, que a leitura da reportagem atacava não somente a ele, mas serviria, ainda, para “desestimular alunos e entidades que buscam seu ensino”. Essa argumentação foi desmontada ainda antes da sentença, por este blog, no post que pode ser acessado aqui.
Em 26 de novembro de 2010, portanto, na semana passada, a juíza Adriana Sachsida Garcia, do Tribunal de Justiça de São Paulo, julgou improcedente a ação de Gilmar Mendes e extinguiu o processo contra mim e a CartaCapital. Dentre outras considerações, afirmou:
“As informações divulgadas são verídicas, de notório interesse público e escritas com estrito animus narrandi. A matéria publicada apenas suscita o debate sob o enfoque da ética, em relação à situação narrada pelo jornalista. Não restou configurado o dolo ou culpa, condição sine qua non para autorizar a condenação no pagamento de indenização. A população tem o direito de ser informada de forma completa e correta, motivo pelo qual esse direito deve sobrepor-se às garantias individuais, sob determinadas circunstâncias, como são as objeto de análise.”
Abaixo, alguns trechos da sentença proferida pela juíza Adriana Garcia. A decisão ainda é passível de recurso por parte da defesa do ministro Gilmar Mendes:
“(…) Desnecessária a colheita de outras provas, pois a matéria é eminentemente de direito e os fatos controversos vieram bem comprovados por documentos, de maneira que autorizado o julgamento antecipado, em conformidade com a regra do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. O pedido é improcedente. (…) Ocorre que, a documentação trazida com a defesa revela que a situação exposta é verídica; o que, aliás, não foi negado pelo autor.”
“Considerado o modelo da reportagem e as palavras utilizadas, não vislumbro ofensa ao ordenamento jurídico, condição indispensável para a condenação no pagamento de indenização.”
“O tema exige cautela do julgador para que não incida na odiosa restrição das liberdades de informação e de expressão, as quais contêm o direito de criticar. Careceria de justa causa a notícia falsa ou imprudentemente divulgada, mas não a baseada em fatos reais e de manifesto interesse público.”
“Insta aqui destacar que a reportagem de fato assevera não haver ilegalidade no proceder do autor ou de qualquer das pessoas físicas mencionadas, tanto que eminentes juristas foram entrevistados para emitir opinião técnica sobre a participação de magistrados em sociedades empresariais e restou registrada a controvérsia existente sobre o tema.”
“Não se considera ‘caviloso’ o texto do jornalista porque não criou fatos ou incluiu inverdades, nem omitiu dados importantes ao bom entendimento da notícia. De fato, já na inicial, o autor reconhece que o Ministro Gilmar Mendes é sócio da empresa e detém uma terça parte das quotas sociais. (…) Bem assim, a inicial admite a realização de contratos com vários órgãos do Poder Público no âmbito federal, com dispensa de licitação, por inexigibilidade.”
“Ainda, o autor relata que possui corpo discente de alto gabarito, ilustrado por figuras ocupantes do alto escalão dos diferentes Poderes da República. E se os fatos não são mentirosos, não vejo fundamento jurídico para coibir o livre exercício do questionamento e da crítica pela imprensa.”
“A reportagem impugnada consubstancia regular exercício de direito, consubstanciado em crítica jornalística própria dos regimes democráticos. A doutrina e a jurisprudência concordam que, pelo menos para efeito de responsabilidade civil, a licitude da matéria jornalística decorre do interesse público, da veracidade e pertinência de seu conteúdo.”
“E, finalmente, também o conteúdo é pertinente – não obstante a crítica inserida – havendo articulação lógica entre o conteúdo narrado e as conclusões expostas. A relevância dos fatos narrados foi apresentada de modo adequado em relação ao contexto dos fatos noticiados. A documentação acostada pela defesa demonstra que foi apurada a procedência dos fatos narrados, de modo a neutralizar a alegação de que houve divulgação precipitada e indevida de fatos aptos a arruinar a reputação das pessoas citadas.”
“Não se pode cogitar de verdadeira liberdade de informação e expressão sem a possibilidade da crítica, a possibilidade de emitir juízo de valor – favorável ou não – em relação a determinado comportamento.”
“Reconhecer ilicitude, sem provas sobre animus injuriandi ou animus nocendi, constitui, pelo peso da indenização por dano moral, restrição que se aproxima da censura”
“Condeno o autor no pagamento das verbas oriundas de sua sucumbência, com honorária que fixo em R$ 5.000,00 para cada um dos co-réus, atualizados monetariamente a partir da data desta sentença pelos índices da Tabela Prática editada pelo Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado, nos termos do que preceitua o artigo 20, § 4º, do mesmo Código de Processo Civil. Transcorrido o prazo para recurso, ou processado o que houver, diligencie a serventia o arquivamento dos autos, observadas as formalidades legais e cautelas de praxe.
P.R.I. São Paulo, 26 de novembro de 2010.
Adriana Sachsida Garcia Juíza de Direito”
Aqui, a íntegra da sentença.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Lula reconhece Estado palestino

Do UOL Notícias
Em São Paulo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou carta para o presidente da Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, reconhecendo o Estado palestino "nas fronteiras existentes em 1967", segundo informação do Itamaraty divulgada nesta sexta-feira (3).
"A iniciativa é coerente com a disposição histórica do Brasil de contribuir para o processo de paz entre Israel e Palestina, cujas negociações diretas estão neste momento interrompidas, e está em consonância com as resoluções da ONU, que exigem o fim da ocupação dos territórios palestinos e a construção de um Estado independente dentro das fronteiras de 4 de junho de 1967", afirma nota do ministério das Relações Exteriores.
A iniciativa é uma resposta a correspondência enviada em 24 de novembro de Abbas a Lula. "Enquanto expressamos a Vossa Excelência o nosso orgulho das valorosas e históricas relações brasileiro-palestinas, que refletem suas posições firmes em relação ao nosso povo ao longo dos anos e em nossos recentes encontros, esperamos, nosso caro amigo, que Vossa Excelência decida tomar a iniciativa de reconhecer o Estado da Palestina nas fronteiras de 1967", escreveu o presidente palestino a Lula.
"Essa será uma decisão importante e histórica, porque encorajará outros países em seu continente e em outras regiões do mundo a seguir a sua posição de reconhecer o Estado palestino. Essa decisão levará também ao avanço do processo de paz e à promoção da posição palestina, que busca o reconhecimento internacional do Estado da Palestina. Esperamos que o nosso pedido possa receber sua bondosa aceitação e esperamos também que essa iniciativa possa ser tomada antes do fim de seu mandato presidencial", acrescentou Abbas.
Em 1º de dezembro, o presidente brasileiro respondeu à solicitação. "Por considerar que a solicitação apresentada por Vossa Excelência é justa e coerente com os princípios defendidos pelo Brasil para a Questão Palestina, o Brasil, por meio desta carta, reconhece o Estado palestino nas fronteiras de 1967", escreveu Lula.
"Ao fazê-lo, quero reiterar o entendimento do Governo brasileiro de que somente o diálogo e a convivência pacífica com os vizinhos farão avançar verdadeiramente a causa palestina. Estou seguro de que este é também o pensamento de Vossa Excelência", acrescenta.
O Itamaraty destaca que "o Brasil reafirma sua tradicional posição de favorecer um Estado palestino democrático, geograficamente coeso e economicamente viável, que viva em paz com o Estado de Israel. Apenas uma Palestina democrática, livre e soberana poderá atender aos legítimos anseios israelenses por paz com seus vizinhos, segurança em suas fronteiras e estabilidade política em seu entorno regional". 

Sobre Geisy e as mulheres

Li um texto no blog da Marjorie que considero um excelente resumo da hipocrisia reinante, em nossa sociedade,  construída por valores referenciados pela TV aberta. Daí que, no mesmo lugar, encontrei uma dica bacana (nos comentários) de uma charge do falecido cartunista Glauco, que descreve exatamente o que está no texto.


Não é à toa que sempre fui fã de cartunistas. Resumir em poucos traços o que nós fazemos força pra descrever em palavras é mesmo uma arte.


Então, quem ficar com preguiça pra ler o texto (ainda assim recomendo muito, confiem, é diferente de tudo que já leram sobre o assunto), o cartum abaixo fala por si. Aliás, infelizmente, fala por nós.



sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Geração XY

Para quem nasceu no final dos anos 70 início dos anos 80, como eu, o enquadramento nesses padrões de gerações fica um tanto prejudicado. Nos influenciamos por grupos sociais da época, como os punks e até por ídolos como Martin Luther King e Che Guevara, mas já no finalzinho dessa época, posto que éramos crianças ainda (bem que eu gostaria de ter ido ao Woodstock!). Meus pais foram Baby Boomers e, cariocas, passaram sua juventude freqüentando o Pier de Ipanema, ouvindo Novos Baianos e indo às passeatas da UNE.


Já eu, nunca me senti pertencente a grupo algum, gostava de misturar tendências, de experimentar coisas novas e de ser tudo ao mesmo tempo, skatista, surfista, hippie, ou nada. Pelo vídeo abaixo, meu comportamento se encaixaria na Geração Y. Essa aliás, é a característica mais bacana da atual geração, liberdade de ser o que quiser, sem rótulos ou padrões. Infelizmente, é também a geração mais consumista e isso, infelizmente, os coloca na contramão do sonho das gerações anteriores.


Sempre me senti pertencente à um mundo que precisava ser melhor e ainda me sinto assim. Como alguém que participa de um processo, parte de um história que pode beneficiar a todos (se fizermos as escolhas certas, claro). E isso me coloca de volta na Geração X, a que ousou sonhar e onde alguns de fato deram suas vidas por esse sonho. Ter me filiado à um partido socialista, quando quase todos os meus amigos só pensavam na próxima festa, é um exemplo. Mas, felizmente, eu não era a única.


E nesse caso, imagino que minha geração, os que se encontram hoje na faixa dos 30 anos, possam ser classificados como "Geração XY", ou seja, exatamente no meio da transição entre uma e outra.


Se a inquietação da Y é influenciada pelo raciocínio não-linear da internet, a X tem o componente da utopia, do sonho, que nos torna novamente humanos, porque sonhar não custa nada e pode sim, transformar o mundo. A Geração XY é a que hoje abre espaço para a Y e as que virão, espero que saibamos fazer isso direito.


O vídeo abaixo, foi produzido pela Box1824:



Café com Memória da Estrutural

Aumentam as denúncias de violações de direitos na Vila Cruzeiro


Militantes da Rede contra Violência estiveram ontem, 1º de dezembro, na Vila Cruzeiro, e puderam recolher diversas denúncias de violações dos direitos humanos por parte das forças de segurança estatais (polícia e forças armadas) que ocuparam recentemente a localidade. Nesta visita, também participaram correspondentes de uma televisão européia e jornalistas de um grande jornal paulista.
O ambiente na comunidade é de extrema tensão e é possível perceber o quão apreensivos e desconfiados estão os moradores. Quase toda a atenção destes está voltada para os últimos acontecimentos e suas rotinas foram inteiramente alteradas. Os militantes da Rede ouviram diversos relatos que, de uma maneira geral, expressavam a preocupação dos moradores com o que poderia acontecer com seus familiares e em suas casas quando lá não estivessem.
À medida que caminhavam, os referidos militantes e jornalistas eram abordados por moradores revoltados com a situação e que gostariam, de alguma forma, de denunciar a situação que estavam vivenciando. Não era preciso abordar as pessoas e perguntar sobre violações, os moradores procuravam-nos espontaneamente. Ouvimos queixas e denúncias de cerca de 30 pessoas. A cada passo ficava muito claro que a versão oficial de um apoio irrestrito da população local à ação do Estado não se sustenta.
Há uma preocupação generalizada com a forma como as revistas aos moradores e às casas são realizadas. Diversas pessoas, que quase sempre não queriam se identificar por medo do que lhes poderia acontecer, já que temem represália às suas denúncias, reclamavam de humilhações sofridas, especialmente as diferentes formas de violência física e psicológica às quais foram submetidos. Muitos, é possível afirmar, foram ofendidos em sua dignidade de seres humanos.
O procedimento padrão utilizado pelos policiais, especialmente os da polícia militar, é o seguinte: sem mandato de busca e apreensão ou outra autorização judicial, que legalmente permitiria a entrada nas casas, os agentes de segurança arrombam portas, portões e grades, com pessoas no interior ou não. Reviram os móveis e outros pertences, levam objetos de valor e quebram o que sobra. Em uma das primeiras casas que visitamos, percebemos muitos objetos revirados e jogados no chão. A moradora nos informou que os policiais levaram a televisão e inclusive o chuveiro do banheiro. A geladeira desta moradora foi vendida pelos policiais a outro morador local pelo valor de R$ 500,00.
Um grupo de moradores que os militantes da Rede encontraram ao caminhar pela comunidade disseram que não agüentam mais a presença da polícia. Dizem que agora são obrigados a trancar toda a casa e estão com medo que roubem seus pertences e outras violências sejam cometidas. Outro morador relatou que arrebentaram a porta de sua residência e que agora têm que tomar mais cuidado. No momento em que conversavamos com este último, aparece um senhor, que mora na localidade há mais de 50 anos, e reclama da repetição das abordagens dos policiais às casas. Mais a frente, um grupo de mulheres reclama que entrou em contato com a Comlurb para que esta retirasse carros queimados próximos às suas residências, mas não obtiveram resposta.
Além das críticas aos arrombamentos e roubos de objetos, muitos moradores reclamaram da forma de tratamento desrespeitosa e humilhante por parte dos agentes de segurança. Uma moradora disse que "eles nos tratam como bicho". Ela ainda informou que policiais do Batalhão de Operações Especiais (BOPE) têm uma atitude completamente diferente quando não há mais luz do dia ou as câmeras da imprensa por perto. Reclamaram, ainda, da truculência dos policiais do 16° Batalhão.
Em outra situação, policiais do 22° Batalhão, não identificados (como, de resto, acontece com a maioria dos policiais), entraram numa casa, amordaçaram um jovem, levaram-no para um dos cômodos da residência e retiraram os seus familiares, inclusive crianças recém nascidas, colocando-as na rua. Enquanto mantinham o jovem amarrado, bateram nele com um cabo de vassoura. Perguntavam se ele possuía alguma informação sobre bandidos, mas o jovem afirmava que não. Em vão. Os policiais perguntaram, então, se ele tinha dinheiro, pois, se tivesse, não quebrariam nada em sua casa. Entretanto, percebendo que as pessoas ali eram pobres, os policiais quebraram o forro do teto e pegaram celulares. Importante mencionar que alguns policiais estavam de touca ninja. Antes de irem embora, ainda pegariam uma foto do referido jovem, sem explicar o motivo de tal atitude.
Durante toda a caminhada realizada, a principal denúncia recebida foi a de que um outro jovem teria sido assassinado pela polícia, fato não noticiado pela imprensa. Segundo informações, os policiais acharam que se tratava de um traficante. O jovem foi morto e seus restos mortais jogados a animais.
A comitiva da Rede e da imprensa foi à localidade da Vila Cruzeiro chamada Vacaria, onde até a tarde de sábado (27/11) haviam cadáveres insepultos sendo devorados por porcos. Sentimos o forte cheiro de decomposição, vindo de um matagal, mas foi impossível verificar a existência de restos humanos. Uma viatura da PM (que foi filmada pelo cinegrafista da TV estrangeira) passou por nós e dela exalava forte odor de restos em decomposição.
Oficiaremos o Ministério Público no sentido de organizar uma ida à comunidade, sem acompanhamento policial ou da imprensa, para que as inúmeras denúncias possam ser formalizadas com segurança pelos moradores.

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