"Se não estás prevenido ante os meios de comunicação, te farão amar o opressor e odiar o oprimido" Malcom X

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Fidelidade Partidária: para que e porquê?

Disponibilizo aqui uma análise desta notícia. O texto é do Prof. Carlos Hugo Santander* (especial para o Diário do Congresso http://www.diariodocongresso.com.br/), Dr. pela UnB em Estudos Comparados e Prof. de Direitos Humanos no curso de Mestrado em Ciência Política do Unieuro.
--------------------------------------------------------------------------------------------

A decisão do STF sobre o mandato de segurança deve se converter em uma decisão histórica na política do Brasil. O otimismo de alguns se baseia na decisão interposta pelo então PFL, hoje DEM, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que por seis votos a um, decidiu que o parlamentar que trocar de partido depois da eleição pode perder o mandato.

Antes disso é pertinente responder: Por que os parlamentares trocam de partido? É óbvio: pelas vantagens que obtêm do governo na perspectiva de se elegerem nas eleições futuras. Mas a questão é, por que são recrutados esses parlamentares nesses partidos antes das eleições? São recrutados em função do interesse do próprio partido que, em vista da ausência de bases ideológicas ou programáticas, não consegue a coesão dos parlamentares, até por que a eleição para muitos parlamentares é um investimento de interesse para o partido e para o próprio candidato. Além do que os partidos políticos são estimulados a funcionar assim pelo sistema eleitoral, pois o custo de uma campanha é altíssimo. Assim, as eleições internas nas convenções partidárias terminam sendo um teatro de mamulengo onde a ratificação se impõe a favor daqueles investidores que entendem que a política é um mercado, daí a precariedade dos partidos.

É claro que a infidelidade partidária é questionável, não só desde o ponto de vista ético, pela erosão que sofrem as instituições democráticas representativas, como pela natureza das trocas de recursos por apoio político ao governo. Os parlamentares trocam apoio político por cargos púbicos ou outros recursos. E é público que o governo para poder governar deve construir maioria no Legislativo por meio da provisão desses recursos burocráticos aos parlamentares, sejam estes legais ou ilegais. Ou seja, a “república” a serviço do projeto de poder pessoal de alguém ou de um grupo partidário.

Clientelismo – O dilema se o mandato do parlamentar pertence ou não ao cidadão, ou se pertence ao partido, domina o debate. Ao contrário, o parlamentar quando candidato atende à população com critérios clientelistas se “apropriando” dos votos dos eleitores. Ou pior ainda, o fato ocorre num contexto onde a maioria dos eleitores nem lembram em qual candidato votou. Os partidos, por outro lado, reivindicam para si o controle sobre o parlamentar quando em uma votação como a da prorrogação da CPMF já que, para enfraquecer o governo, hoje combatem a proposta, quando antes eram a favor.

Não obstante, a questão do STF deve ir além de nossos próprios desejos. Se a Corte Suprema declarar a perda do mandato dos deputados federais eleitos pelo PPS, PSDB e do DEM poderá confrontar a própria Constituição, da qual é guardiã. Isso porque ela define claramente (art. 55) em que casos os senadores ou deputados devem perder o mandato, e quando infringirem os artigos (art. 53 e 54). Só que a infidelidade partidária não está prevista nesses artigos. Depois porque contraria o próprio espírito da Constituição, que declara que os representantes não estão sujeitos a mandato imperativo, ou seja, imediatamente depois de eleitos, seus mandatos são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. (EC nº 35/2001).

Ao mesmo tempo, se o STF negar o pedido demandado pelo DEM (ex-PFL) o país não conseguirá modificar o que os próprios parlamentares não querem no fundo reformar – incluindo os próprios demandantes. Ou ainda, se “houver” interesse – o que realmente não existe – de modificar os meios pelos qual se faz política no Brasil, seria necessário democratizar os partidos, definir se a lista será fechada ou aberta, o financiamento de campanhas, o poder dos parlamentares de efetuar emendas ao orçamento da República, entre outros, obviamente que a fidelidade partidária teria um outro impacto. Mas parte dos próprios membros do PSDB e outros do DEM não querem nem uma coisa e nem a outra.

Governabilidade em risco – É preciso reconhecer que a infidelidade partidária, gostem ou não, serve e serviu para montar maiorias nos diversos governos pós transição, passando pelo governo de Fernando Henrique Cardoso como do atual governo. No país, de acordo com o sistema eleitoral, é impossível converter maiorias em razão da natureza do sistema eleitoral que centra a disputa nas pessoas e não nos partidos e nem nos programas. Então, não considerar este contexto político – e não jurídico – implicará um sério problema de governabilidade para o país, pois tornará rígida a viabilidade das votações no Congresso e a previsibilidade da ação do governo, o que será de provável conflito. Então, o mandato de segurança tem outro sentido. Seria ingênuo acreditar que significa a recuperação da função parlamentar ou o aperfeiçoamento do estado de Direito, quando o objetivo real é atingir indiretamente o governo.

Acreditamos que a decisão do STF deverá ser salomônica, e a regulamentação da fidelidade partidária deverá valer para as próximas eleições. Isto é na verdade um retalho da reforma política que deixa nus os próprios parlamentares, já que os interessados jamais se auto-reformaram por que as “virtudes” dos vícios nos procedimentos eleitorais é o berço de sua própria reprodução como classe política.

Nenhum comentário:

Feed do Substantivu Commune