Uma grande amiga e professora de literatura, Icléia, me ensinou a entender a beleza de Manoel de Barros. Isso já tem alguns anos. Desde então, me apaixonei por ele perdidamente.
"(...) essa estrada melhora muito de eu ir sozinho nela. Eu ando por aqui desde pequeno. E sinto que ela bota sentido em mim (...)"
Foi redigindo cartas que ele se tornou um dos maiores poetas brasileiros do século 20. Esse simpático e despojado senhor, que já passou dos 90 de idade, escreve com a simplicidade e delicadeza dos que foram criados no campo. Tudo que não presta serve para a poesia de Manoel de Barros. O primeiro que li - "Matéria de poesia" - é uma construção, um retalho de palavras, incluindo o que ele chama de "inutensílios" ou "desobjetos" (expressões que ele criou para os pertences abandonados que se tornam poesia sob seu olhar).
"Uso as palavras para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar. Dou mais respeito às que vivem de barriga no chão, tipo água pedra sapo (...)"
Daí que ganhei de alguém muito especial "Memórias inventadas - A infância", uma caixinha linda com folhas soltas como os versos de Manoel e iluminuras de Martha Barros, sua filha. Ganhei há pouco e já li várias vezes. Fico emocionada porque esse livro fala de lembranças que, prafraseando o próprio, me "dão saudade do que não fui". Passei muitos momentos em fazendas, beiras de rio, praias de pé descalço, vento no cabelo... No verso em que relata a observação de um pente, deixado sob uma árvore, ele desperta o leitor para a liberdade de experimentar de forma ingênua, descomprometida até, a construção dos versos com as palavras. Algo que para ele é simples, natural. Para quem lê, é mágico, emocionante, singular... Recomendo muito a aquisição desta singela caixinha de palavras, folhas e versos soltos. Para si, para presente, para guardar.... vai por mim gente, é inesquecível. Mesmo.
"(...) E o menino deu pra imaginar que o pente, naquele estado, já estaria incorporado à natureza como um rio, um osso, um lagarto. E acho que as árvores colaboravam na solidão daquele pente (...)."
P.S.: Aqui em Brasília, pode-se adquirir no Café com Letras (SCLS 203 sul, lj. 19).
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