Por Pedro César Batista, escritor e jornalista.
A internet e a televisão brasileira têm mostrado uma grande quantidade de imagens com a divisão do resultado da corrupção dos governantes do Distrito Federal. O esquema, segundo a Polícia Federal, era chefiado pelo governador Roberto Arruda, envolvia secretários, um terço dos parlamentares da Câmara Distrital e três desembargadores do TJDF. São tantas as gravações que sempre aparece uma nova denúncia. As mais recentes mostraram o repasse a parlamentares federais de vários estados, inclusive o envolvimento do presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer.
Como resposta a essa bandalheira, um grupo de estudantes e lideranças de várias organizações de Brasília ocupou a sede do legislativo local. Foram apresentados, por vários grupos e pessoas, sete pedidos de afastamento do governador. Pipocam manifestações por todos os lados na defesa da punição desses corruptos. Especialmente o impeachment do governador, que não é réu primário, depois que violou o painel do Senado.
Em 2004 o Brasil conheceu o que ficou conhecido por mensalão. Ocorreram manifestações de rua e ainda hoje há ações tramitando no STF. Agora, o PFL, digo DEM, mostra um esquema semelhante, bem mais estruturado, pois envolveu os três poderes. Um esquema que vem desde os tempos do coronel Joaquim Roriz, que foi obrigado a renunciar para não ser cassado. Se dentro do Congresso Nacional e nas estruturas do aparelho de Estado do Distrito Federal isso ocorre, podemos imaginar o que acontece no interior do Brasil, um país continental.
Conquistamos o restabelecimento das liberdades políticas após derrotar a ditadura militar, afastamos Collor de Melo da Presidência da República, com a descoberta do esquema montado pela gang que estava no poder. Naquele momento havia uma unidade das forças democráticas e populares para desenvolver as lutas e enfrentar os inimigos. Juntos, partidos, centrais sindicais, igrejas, movimentos populares e estudantis conseguiram realizar grandes mobilizações. Milhões de pessoas foram às ruas defender a ética na política.
Decorridos 20 anos podemos verificar a pulverização das ações em defesa da construção da cidadania e de um mundo melhor. O discurso feito pelo ideólogo da ditadura, Golbery do Couto e Silva, parece ter vingado. Enquanto na Argentina os milicos que prenderam, torturaram e mataram são julgados e condenados, aqui, em terras verde-amarelas, Delfin Neto, o todo poderoso da ditadura, transformou-se em guru do presidente, um ex-preso político. Ao mesmo tempo, as organizações que enfrentaram as balas e a morte nesse tempo de horror, agora disputam uma fatia de poder, aparições no jornal das 8 ou o medo do surgimento de novos atores. A palavra de ordem “O povo unido jamais será vencido” foi abandonada, ficando apenas o discurso para agregar amigos, afilhados e seguidores.
No caso de Brasília essa divisão fica evidente. Porque foram apresentados oito pedidos de impeachment de Roberto Arruda, no lugar dos movimentos, partidos e pessoas interessadas realizarem uma plenária para agirem de forma unitária. Porque a população não participa, mesmo se revoltando, das manifestações contra os corruptos e a corrupção? Lembro-me do tempo em que as organizações tentavam “recrutar” novos militantes, agora, percebe-se uma insegurança nos dirigentes e militantes quando aparece alguém que não é do grupo.
Isso tudo chama a atenção. O Brasil continua como um dos países com a maior concentração de renda no mundo, o analfabetismo ainda é uma chaga em nossa sociedade, a corrupção é algo corriqueiro nos atos da maioria dos políticos, que abandonaram a política e passaram a atuar como meliantes, e, apesar de tudo, não se constrói a unidade em defesa da ética, da justiça social e não são realizadas as mobilizações necessárias.
A cara de pau de políticos corruptos, mostrada em rede, negando o que é visto não é um fato concreto que exige a unidade dos que se dizem ao lado dos mais pobres e necessitados? Será que a prática política da direita, a busca desesperada pelo poder, contaminou a maioria?
O poeta angolano Agostinho Neto, líder da luta pela independência daquele povo, deixou escrito: “não basta que seja justa e pura a nossa causa, é necessário que a justeza e a pureza estejam dentro de nós”. Na atualidade, onde o sentimento neoliberal se tornou uma pandemia, será impossível resgatar esse sentimento?
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