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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A Polícia de Nova York está na lista de pagamentos dos gigantes financeiros

Fonte: Carta Maior

Repressão policial em Wall Street



Wall Street é o único setor que conta com um sistema de justiça privado, no qual se resolvem crimes fora dos tribunais, em processos de arbitragem secretos, que sugaram já bilhões de dólares dos cofres públicos, que escaparam de serem julgados pelo colapso financeiro e que pode pôr a polícia municipal nas rédeas, para intimidar os manifestantes que buscam ajustar a sua democracia. O artigo é de Pam Partens.

Na internet estão surgindo novos vídeos que mostram membros uniformizados da polícia de Nova York com camisa branca (à diferença dos típicos uniformes da Polícia de Nova York), jogando spray de pimenta e com atitudes brutais contra manifestantes pacíficos que não representam qualquer ameaça e que tentar fazer parte da marcha Ocupa Wall Street. Os grandes meios de comunicação informaram que essas camisas brancas são supervisores da polícia e não oficiais. No entanto, os documentos recentemente descobertos sugerem que isso não é totalmente verdadeiro. 

Os gigantes de Wall Street contam com um número sem fim de oportunidades para privatizarem seus lucros e socializarem as perdas, além de recolhem bilhões de dólares em resgates, dos contribuintes. Um dos métodos mais engenhosos que passaram despercebidos foi iniciado no governo de Rudy Giuliani, em Nova York, em 1998. Chama-se a Unidade de Serviço Policial Pago, que permite que a Bolsa de Nova York e as corporações de Wall Street, inclusive aquelas acusadas de múltiplas fraudes, contratem um contingente e agentes policiais de Nova York, com a mesma facilidade com que pedem uma pizza. 

As empresas pagam em média 37 dólares por hora (sem assistência médica, direito a aposentadoria e sem horas extras) por policial de Nova York, com arma, esposas e poder de polícia. O policial é indenizado pelo contribuinte, não pela corporação.

Nova York recebe uma cota de 10% por gastos de administração adicionais aos 37 dólares por hora que se paga à políica. O orçamento de 2011 da cidade inclui um milhão, cento e oitenta e quatro mil dólares em receita, pela Unidade de Serviço Policial Pago, quer dizer, as empresas privadas estavam pagando 11,8 milhões de dólares em salários aos policiais da Unidade Paga. A contribuição do programa ao orçamento mais do que duplicou, desde 2002.

O contribuinte paga o treinamento dos policiais de aluguel, seus uniformes e pistolas e paga os custos das demandas judiciais contra o abuso de força policial cometido por esses agentes ao aplicarem as instruções legais de seus amos corporativos. E olhem que há demandas desse tipo.

Quando se deu início ao programa originalmente, um membro perspicaz da polícia de Nova York publicou o seguinte num foro eletrônico: “...em relação ao oficial que trabalha e é pago por algumas das pessoas e organizações mais ricas da cidade, senão do mundo, cumprir as ordens da empresa privada, de fato converte o oficial da polícia numa guarda pretoriana da elite da cidade. Assim, a corrupção deixa de ser um problema. A quem eles pensam que enganam?”

Só este ano o Departamento de Justiça revelou sérios problemas com a unidade de polícia paga de Nova Orleans onde se enfrenta um tsunami de acusações de corrupção que revelam pagamentos em dinheiro aos policiais e a criação, por parte de membros do Departamento, de sociedades de responsabilidade limitada para executar mais de 250 000 dólares em trabalhos da unidade paga, na conta do orçamento municipal.

Quando o banco tristemente célebre de Nova York, a Lehman Brotheres, em 15 de setembro de 2008, sua declaratória de quebra de 2009 revelou que devia dinheiro a 21 membros da Unidade de Polícia Paga de Nova York (o departamento não respondeu às nossas solicitações por telefone nem ao correio eletrônico em que solicitamos informação sobre as firmas de Wall Street que participam do programa. Os sindicatos policiais afirmam ter escassa informação sobre o programa).

Outras empresas de Wall Street que se sabe que utilizou o serviço policial pago são a Goldman Sachs, o complexo do World Financial Center, que alberga múltiplas empresas financeiras e a Bolsa de Nova York.

A Bolsa de Nova York é o edifício na frente do qual os manifestantes do Ocupa Wall Street tentaram protestar, sem êxito, sendo conduzidos para trás das barricadas de metal, golpeados com cassetetes e chutes na cara e levados presos para impedirem que a última plantação dos Estados Unidos fosse contaminada com cânticos e cartazes cidadãos (cartazes politicamente inconvenientes e cantos que repetem: “os corruptos tem medo de nós, os honrados nos apoiam, os heroicos, nos unem”, “Diz-me como é a democracia, assim é a democracia”, “Acreditarás que uma corporação é uma pessoa quando o Texas execute a uma”. Este último cartaz se refere à decisão da Corte Suprema dos EUA de 2010, do caso Cidadãos Unidos versus a Comissão Federal Eleitoral, que outorgou as corporações a qualidade de pessoa sob a Primeira Emenda, o que lhes permite gastar quantidades ilimitadas de dinheiro nas campanhas eleitorais).

Em 8 de setembro de 2004, Robert Britz, então Presidente e codiretor de operações da Bolsa de Nova York, declarou o seguinte à Comissão Estadunidense de Serviços Financeiros: “Implementamos novas normas de contratação que requerem experiência policial ou militar para o pessoal da segurança...Estabelecemos um perímetro de vigilância dos centros de dados com Unidades Policiais Pagas...Pusemos em marcha o controle do tráfico e a detenção de veículos em postos de controle. Instalamos barreiras móveis e fixas”.

Antecedentes militares, policiais nova-iorquinos a um salário de 24-7, postos de controle, barreiras para veículos? É inacreditável pensar que a Bolsa de Nova York originalmente negociava as ações com um aperto de mãos debaixo de uma árvore ao ar livre, na Rua do Muro.

Em seu testemunho, o executivo da Bolsa de Nova York, Britz, indicou que “nós” fizemos isso ou “nós” fizemos aqui, ao falar de funções que claramente pertenciam à municipalidade de Nova York. Nesse momento, a Bolsa de Valores de Nova York não era de capital difundido e pertencia a quem tinha comprado ativos – principalmente às maiores empresas de Wall Street. Por acaso a Bolsa passou a ter poder de polícia para fechar ruas e estabelecer pontos de controle com policiais de aluguel? De golpear manifestantes nas calçadas?

Apenas seis meses antes do testemunho de Britz frente a uma comissão do Congresso, sua organização estava sendo demandada judicialmente na Corte Suprema do Condado de Nova York por tomar o controle de maneira ilegal da via pública. Esta ação tinha paralisado o negócio de um estacionamento, o Wall Street Parking Garage Corp, o demandante do caso. 

O juiz Walter Tolub disse que em sua opinião “uma entidade privada, a Bolsa de Nova York, tinha assumido a responsabilidade de patrulha e manutenção de bloqueios em sete encruzilhadas ao redor da Bolsa de Nova York...ao que tudo indica sem a concessão de qualquer autoridade formam para manter esses bloqueios e ou para realizar registros de segurança em tais pontos de controle...o fechamento dessas encruzilhadas pela Bolsa de Nova York proporcionou uma alteração da ordem pública...A Bolsa de Nova York ainda não ofereceu a este Tribunal qualquer evidência de um acordo que lhe dê autoridade para manter um perímetro de segurança ou para realizar as batidas policiais que sua força de segurança privada comete todos os dias. Portanto, as ações da Bolsa de Nova York são ilegais e judicialmente demandáveis, já que violam direitos civis do demandante como cidadão privado”.

Houve apelação, a sentença foi revogada e retornou ao mesmo juiz que não teve outra opção que indeferir o caso ante a sentença de apelação, já que o demandante “não tinha sofrido nenhum dano maior que aquele da comunidade em geral”. Todo mundo em Manhattan que tem uma vaga numa garagem de estacionamento que está perdendo os seus clientes porque as ruas estão bloqueadas?

Alguns acreditam que Wall Street tem privilégios e proteção porque o prefeito de Nova York, Michael Bllomberg, deve-lhes 18 bilhões de dólares (sim, ele é dos 1% que protesta contra os 99%) a Wall Street. O prefeito foi em sua vida pregressa agenda do Salomon Brothers, o banco de investimentos que se tornou famoso por tentar enganar o Tesouro dos EUA com bônus de dois anos.

O império comercial do prefeito, que leva o seu nome, inclui o impressionante terminal Bloomberg, que aloja enormes quantidades de dados sobre os preços das ações e os bônus, pesquisa, notícias, funções de gráficos e muito mais. Atualmente, estima-se que há 290 000 terminais nos pisos de negociação das bolsas ao redor do mundo, que geral aproximadamente 1500 dólares em aluguel por terminal, por mês. Isso significo uns nada desprezíveis 435 milhões ao mês, ou 5,2 bilhões ao ano, a galinha dos ovos de ouro de Bloomberg.

Os negócios de Bloomberg funcionam independentemente da prefeitura, mas sem dúvida o prefeito sabe que seus terminais são um componente essencial de sua riqueza. 

No entanto, o prefeito não é nenhum títere de Wall Street. Com frequência, a Bloomberg Publishing está na vanguarda das denúncias de fraude em Wall Street, assim como aconteceu em 2001, com o artigo “Os flautistas de Hamelin de Wall Street”, de Benjamin Mark Cole, que expôs a prática de publicar investigações fraudulentas sobre ações. E o canal Bloomberg News foi responsável pela ação judicial que obrigou o Federal Reserve a publicar os detalhes do que fez com os bilhões de dólares do resgate dos contribuintes para empresas, fundos de cobertura e bancos estrangeiros de Wall Street. 

O comissário de Polícia Ray Kelly também pode ter um fraco por Wall Street. Ele já foi Diretor de Gestão de Segurança Corporativa Global de Bear, Sterans & Co.Inc., a firma de Wall Street que caiu nos braços do JPMorgan em março de 2008. 

Também foi uma porta giratória entre os milionários de Wall Street e a polícia de Nova York. Uma das decisões profissionais mais desconcertantes foi a de Stephen L. Hammerman, que deixou um forte pacote que compensação como vicepresidente da Merrill Lynch & Co., em 2002, para trabalhar como Comissário Adjunto de Assuntos Jurídicos da Polícia de Nova York, entre 2002 e 2004. Essa medida deixou a todos em Wall Street com os cabeços em pé, na época. Merrill caiu nos braços do Bank of America em 15 de setembro de 2008, o mesmo dia da quebra do Lehman.

Wall Street não é o único setor que aluga policiais em Manhattan. Os grandes armazéns, os parques, os bancos comerciais e as atrações, como o Rockefeller Centre, o Centro Jacob Javits e a Catedral de São Patrício também têm participado da Unidade de Polícia Paga, segundo uma informação privilegiada. Mas Wall Street é o único setor que conta com um sistema de justiça privada no qual se resolvem crimes foram dos tribunais, em processos secretos de arbitragem, que sugou bilhões de dólares dos cofres públicos, que escapou de ser julgado pelo colapso financeiro e que pode pôr a força policial municipal nas calçadas para intimidar manifestantes que buscam ajustar a sua democracia.

Vamos aprender muito mais no futuro sobre as táticas que Wall Street e a Polícia de Nova York adotaram contra os manifestantes do movimento Ocupa Wall Street. A prestigiada associação Partneship for Civil Justice Fund apresentou uma ação coletiva contra as aproximadamente 700 detenções efetuadas na Ponte do Brooklyn em 1 de outubro. A denúncia e a informação relacionada estão disponíveis na página da organização www.justiceonline.org

A organização foi fundada por Carl Messineo e Mara Verheyden-Hilliard. O Washington Post os chamou de “os xerifes constitucionais para uma nova geração de protesto”.

A demanda envolverá o prefeito Bloomberg, o comissariado de Polícia, a Cidade de Nova York e uns 30 membros da Polícia de Nova York e, provocativamente, 10 agentes de segurança não identificados que não são vinculados à polícia de Nova York. 

A demanda estabelece algo que restringiu os direitos constitucionais dos manifestantes por muito tempo na cidade de Nova York.

“Como se pôde apreciar nos movimentos por mudança social no Oriente Médio e na Europa, todos os movimentos por justiça social, emprego e democracia necessitam de espaço para respirar e crescer, e é imprescindível que haja um basta às ações das forças da lei utilizadas para impedir as reuniões em massa e a livre expressão das pessoas que tratar de reparar os insultos”.

“Depois de escoltar e dirigir um grupo de manifestantes e outros até a lateral da Ponto do Brooklyn, a polícia de Nova York repentinamente interrompeu o passo e passou a prender centenas de manifestantes na ausência de causa provável [para prisão]. Tinham recorrido a uma forma de embuste, tanto ilegal como físico.”

“O fato de que a mentira e as prisões massivas tinha sido uma operação policial por ordem dos comandos, intencional e calculada, evidencia-se em que os agentes da ordem pública que guiáramos manifestantes através da ponte eram oficiais conhecidos como “camisas brancas”.

Em abril de 2011, fui presa e encarcerada pela polícia de Nova York, enquanto distribuía pacificamente panfletos na via pública convocando para uma reunião de acionistas do Citigroup, panfletos que advertiam para a corrupção crescente dentro da empresa (a fusão ilegal do Travelers Group e Citigroup, e deu lugar à derrogação da Lei Glass-Steagall, a lei de proteção do investidor da era da depressão, que proibia os bancos de depósito de se fusionarem com empresas de alto risco de Wall Street. Muitos de nós que pertencemos a grupos organizados para lutar por justiça, de Nova York, protestamos contra a derrogação [da Lei Glass-Steagall], mas fomos derrotados pelos políticos peões de Wall Street, em Washington).

De um grupo de cerca de duas dúzias de manifestantes da National Organization for Women in New York City, do Rain Forest Action e do inner City Press, eu fui a única detida. Não tinha incorrido em desobediência civil alguma. O Rain Forest Action estava repartido biscoitos da sorte com advertências proféticas sobre o Citigroup e instando os transeuntes a cortarem seus cartões de crédito Citibank. O resto de nós estávamos distribuindo panfletos pacificamente. 

Fui presa a uma barra de aço dentro da delegacia, enquanto me ameaçavam com a acusação de todos os delitos havidos e por haver. Respondi que os únicos delitos que estava inteirada era os que figuravam em meu panfleto e que, até onde sabia, em Nova York não se pode ser preso por divulgar os crimes que as firmas de Wall Street cometem. 

O misterioso e maduro inspetor de camisa branca que ordenou a minha prisão e que se negou a me dizer seu nome desapareceu do informe da polícia quando este foi apresentado, e em seu lugar um jovem oficial assumia a responsabilidade pela minha detenção. O Citigroup só está vivo hoje porque o governo federal introduziu nele uma sonda de alimentação e lhe alimentou com 2 bilhões de dólares em empréstimos, investimos diretos e garantias, quando a empresa marchava para o colapso.

No momento de minha prisão, a polícia de Nova York era dirigida por Bernard Kerik – o homem que o presidente George W. Bush enviaria ao Iraque para ser o primeiro ministro interino do interior e para treinar a polícia iraquiana. Posteriormente, o presidente designou Kerik para dirigir o Departamento de Segurança Nacional para toda a nação, trauma que evitamos todos graças a uma providencial babá ilegal. Hoje em dia, Kerik está cumprindo uma condenação de quatro anos numa prisão federal por uma variedade de atos criminosos. 

O sindicato New York Civil Liberties apresentou uma ação federal em meu nome (Martens v. Giuliani) e nos inteiramos de que a polícia de Nova York tinha estabelecido arbitrariamente uma política de prender e deter durante 72 horas qualquer pessoa que protestasse num grupo de 20 pessoas ou mais. O caso se resolveu com um modesto laudo monetário e com a derrogação dessa prática inconstitucional e desprezível da polícia de Nova York. 

(*) Pam Martens trabalhou durante 21 anos em Wall Street. Passou a última década de sua carreira advogando contra o sistema privado de justiça de Wall Street, que lhe permite resolver os crimes fora das cortes públicas. Ela vem escrevendo sobre temas de interesse público no CounterPounch desde que se aposentou, em 2006 e não mantém qualquer posição, mais ampla ou restrita, a respeito das companhias mencionadas neste artigo.

Tradução: Katarina Peixoto

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