O PT realiza seu 13º Encontro Nacional neste final de semana - o primeiro depois que se tornou governo e o primeiro depois que o partido foi atingido pela mais séria crise de sua história. O que chama a atenção nas propostas de resolução encaminhadas ao encontro é a superficialidade com que o partido trata a crise que o atingiu e que atingiu o governo Lula: nenhum balanço crítico ou autocrítico significativo, nenhuma proposta de reforma moral e intelectual ou de atualização (aggiornamento) do partido, capaz de descortinar um novo rumo para a esquerda no Brasil. No máximo, o que se diz é que a antiga direção enveredou pelo caminho da aventura no método a que procedeu para dar sustentação política ao governo Lula no Congresso. Trata-se de uma saída escapista típica, jogando-se a responsabilidade em alguns indivíduos, furtando-se da responsabilidade partidária de enfrentar os dilemas programáticos e teóricos e do método de fazer política.
O texto de diretrizes para a elaboração do programa de governo do PT, no que se refere à parte econômica, resgata uma velha tese, do período pré-governo, que consiste na idéia de que o Brasil precisa passar por um processo de transição de um modelo a outro - "uma transição de um velho Brasil, para um novo projeto nacional de desenvolvimento, capaz de avançar mais rapidamente em direção a um ciclo de crescimento acelerado, fundado na distribuição de renda, macroeconomicamente sustentado, com mínima vulnerabilidade externa a realizar-se num marco de expansão da democracia e da solidariedade continental".
A tese da transição não consegue ir além do anúncio desta generalidade. Para viabilizá-la o documento sugere que o governo e o partido não devem propor uma simples continuidade do que foi feito. Mais adiante o texto sustenta que o governo Lula deu início a uma transição de "um paradigma neoliberal para outro padrão de desenvolvimento", mas destaca que esta obra é ainda parcial, desigual e incompleta. O fato é que o documento de diretrizes não consegue definir os contornos práticos e as medidas concretas da transição e o conteúdo de seu ponto de chegada. Um partido de governo tem a obrigação de ir além das generalidades, conferindo conteúdo e materialidade programática e política aos conceitos que se propõe formular. O texto pontua alguns elementos da política do atual governo que teriam sido limitantes ao incremento da transição. O governo teria conferido autonomia operacional excessiva ao Banco Central, "maior do que em períodos anteriores". Esta circunstância teria permitido uma política monetária que se chocou com as bases sociais do governo e com o próprio governo, "revestida de um discurso conservador". Convém lembrar que o presidente Lula vem enfatizando que a política econômica do governo é uma definição que tem seu total apoio. Tal como é formulada a crítica, é algo como se a diretoria do Banco Central estivesse ludibriando a sociedade e o próprio governo.
O documento petista critica ainda a taxa básica de juros elevada, os elevados superávits primários e as metas da inflação. Em relação aos juros, diz-se que eles tiveram um forte impacto no aumento da dívida pública e na dinâmica da economia. Quanto aos superávits primários, argumenta-se que eles subtraíram recursos para investimentos e custeio, "com conseqüências negativas para o desempenho do governo". Quanto às metas de inflação, o texto diz que elas "foram definidas pelo Conselho Monetário Nacional, sem levar em conta opiniões vocalizadas pelos mais variados setores da sociedade, especialmente os trabalhadores e os empresários dos setores produtivos". O paradoxo do documento petista está no fato de que apresenta como resultados positivos do governo o controle da inflação, a redução da relação dívida-PIB e o crédito consignado, para depois atacar os seus pressupostos, que produziram estes resultados, como a política monetária, o ajuste fiscal e as metas de inflação. Ou seja, o texto ataca o núcleo central da política macroeconômica do governo Lula.
O PT reconhece que os resultados alcançados são bons e propõe que eles sejam mantidos. Mas, ao recusar os meios e instrumentos que os produzem, o texto das diretrizes envereda para o caminho do retrocesso e da ausência de definições concretas sobre o eixo econômico do eventual segundo governo Lula. Em suma, o PT quer alcançar o paraíso sem suor e sem custo e nem sequer fornece o mapa que a ele conduz.
A constatação crítica que o texto faz de que o Brasil cresceu menos do que a média mundial, abaixo dos demais países emergentes e dos países latino-americanos, é a repetição da principal crítica do PSDB ao governo. O problema todo é que as comparações com outros países podem partir de premissas equivocadas e induzir a conclusões falsas, porque elas não levam em conta os problemas específicos de cada economia e seus respectivos patamares de desenvolvimento. Comparar o crescimento da economia brasileira com o crescimento da economia chinesa, sem definir critérios e parâmetros de comparação, não parece ser um procedimento adequado.
As diretrizes do PT, se aprovadas no Encontro Nacional, deverão transformar-se em problema para a campanha de Lula. Uma das condições de êxito do projeto de reeleição consiste na defesa firme das conquistas macroeconômicas consignadas pelo governo, não na sua crítica. O correto, do ponto de vista da lógica do governo, que parece não ser a lógica do PT, consiste em propor avanços na política macroeconômica a partir dos marcos conquistados.
Por Aldo Fornazieri O Estado de S. Paulo 27/4/2006
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quinta-feira, 27 de abril de 2006
UM RETROCESSO DO PT
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