Demorei a me decidir por escrever sobre isso. Estamos em período eleitoral e muitas confusões pra cima de moi podem ocorrer por causa de uma simples "blogada". Mas a questão é que acredito que não podemos fugir desse debate.
Meu filho foi assaltado hoje. Está tudo bem com ele. Foi um grande susto apenas. Mas não é sobre isso, exatamente, que quero falar. É sobre o inegável desamparo que paira sobre a juventude de Brasília.
Apenas para contextualizar, explico que ele se desloca diariamente por um quadrilátero que compreende a escola e as aulas de vôlei e de inglês, todos localizados em pontos muito próximos um do outro e próximos também do meu local de trabalho.
Um homem o abordou hoje perto da quadra poliesportiva das 106/107 sul. Levou o celular e algum dinheiro (trocados que ele tinha no bolso e na carteira). Logo depois, meu filho se dirigiu ao comércio local, pediu ajuda a uma moça na lavanderia (em que costumo ir) e me ligou (aos prantos, lógico).
Um homem o abordou hoje perto da quadra poliesportiva das 106/107 sul. Levou o celular e algum dinheiro (trocados que ele tinha no bolso e na carteira). Logo depois, meu filho se dirigiu ao comércio local, pediu ajuda a uma moça na lavanderia (em que costumo ir) e me ligou (aos prantos, lógico).
Assim que recebi a ligação, liguei para o 190 avisando que ele tinha acabado de ser assaltado, se não poderiam enviar uma viatura, verificar se o cara estava por perto. Me disseram que "estariam providenciando" naquele momento. Cheguei lá e nada, ele estava sozinho. Uma dupla de policiais - os chamados "Cosme&Damião" - passava um pouco mais à frente. Corremos para alcançá-los e começamos a relatar o fato, comentei que havia feito o registro pelo 190. Eles iam anotando as características do sujeito, pareciam enviar os dados para algum whatsapp da polícia (isso não ficou muito claro) e encerraram com um "fica tranquila, vamos resolver isso". Pensei que iniciariam alguma busca, mas eles saíram calmamente batendo papo, continuando a ronda que interrompemos. Decidi ligar novamente para o 190 e ver se a viatura estava a caminho. Para minha surpresa, sequer havia registro da minha chamada anterior. Depois de passar todos os dados novamente (nome, telefone, local etc) o atendente simplesmente me disse que não havia "nada no sistema". Pedi a ele o número do celular 24h que o Batalhão Escolar divulga para recebimento de ocorrências e ele disse que não tinha(!). Agradeci e, antes de desligar, pedi que registrasse meu descontentamento com o serviço, no que ele prontamente respondeu: "para isso, a senhora liga na ouvidoria". Liguei em seguida para uma colega que, por coincidência, há poucas semanas fez uma matéria sobre o altíssimo índice de violência que vem ocorrendo com estudantes nas imediações das escolas do DF e ela me passou o número. Avisei ao atendente que estaria na porta da escola, onde já tinha comunicado à direção sobre o assalto. Esta, por sinal, me relatou que pede TODOS OS DIAS pelo reforço do Batalhão Escolar, ao menos no horário de pico (nas saídas), mas que eles alegam que não há efetivo para isso.
Levou apenas 5 minutos para a viatura do Batalhão Escolar chegar. Esta foi a boa surpresa. A ruim é que eles nos disseram que há somente uma única viatura para toda a região - sim, TODO O PLANO PILOTO - e que, portanto, aquela dupla e aquele carro eram os responsáveis por toda a área (Asas Sul e Norte, Lagos Sul e Norte, etc). Nesse momento, me veio à cabeça que nas outras regiões administrativas (mais periféricas e afastadas do "centro") a situação deve ser bem pior. Senti um aperto no coração pelas crianças e adolescentes que vivem e estudam nessas regiões.
Comentei com eles que fiquei confusa sobre a comunicação entre as polícias já que além do 190 não ter registrado minha chamada, o fato não tinha sido passado nem à dupla que fazia ronda naquela região nem à eles, do Batalhão Escolar. A resposta do policial, em detalhes sórdidos, não poderei escrever aqui. Tanto ele quanto o parceiro, me pareceram (e foram os únicos até ali) realmente interessados na ocorrência e para esse tipo de informação (saber QUEM ele é) sei que a "inteligência" do Estado (falo de todos) funciona muito bem. Sendo assim, não quero prejudicá-lo em um momento de "desabafo" mas, em resumo, eles não tem quaisquer condições (físicas, materiais e outras) de atender às crianças e adolescentes em situações de violência por vários motivos. Mas eles não precisariam me dizer, os fatos gritavam o óbvio.
Primeiramente, me pareceu que não existe uma "comunicação integrada" de fato no sistema de segurança pública de Brasília. Sou leiga nesse assunto, então posso estar falando uma grande bobagem, mas me parece lógico que, ligando para o 190 e informando um assalto naquela área, uma viatura talvez nem fosse necessária, já que uma dupla 'Cosme&Damião' estava a menos de 100 metros de onde meu filho estava. Ou seja, a escala das rondas não deveria ser de conhecimento dos que são responsáveis por mobilizar e deslocar efetivos pela cidade? Houvesse uma forma de comunicação mais efetiva, a dupla teria chegado até ele na metade do tempo que levei para chegar (em meio ao hush do almoço). Talvez até, com sorte e alguma disposição, teriam a chance de encontrar o sujeito. Sinceramente, não sei qual o índice que se usa para determinar até onde se deve ir ou não nestes casos, em termos de alocação de recursos públicos para uma ocorrência, mas o atendimento do 190 me pareceu quase dizer: "ah, foi só um celular e ele está bem? ok, nada a fazer, próximo!". Então, se essa não é uma atribuição deles, pelo crime em si que foi "pequeno" diante de tantas atrocidades que ocorrem por aí, que demandassem ao Batalhão Escolar para que fizessem ao menos um relatório sobre o fato, para estatísticas e estudos que levam a.... estratégias de segurança. Ou não?
Para deixar o caso ainda mais bizarro, o assalto ocorreu há 50 metros de um "Centro Integrado de Proteção à Criança e ao Adolescente". Vejam aí no Google, entrequadras sul 106/107. Há uma quadra poliesportiva (onde pessoas jogam bola, caminham, mas claro, ninguém percebeu o assalto ou não quiseram se envolver) e do outro lado da rua, um posto de gasolina. Colado nele, esse centro, que eu pensei - e os PM´s do Batalhão também pensaram! - ser uma delegacia da mulher (PS: eles não souberam me indicar a delegacia mais próxima para fazer a ocorrência, acreditem se quiser). Passando de carro para que meu filho mostrasse o local exato do ocorrido, o nome no letreiro me chamou a atenção e parei para verificar. Os cones na frente já indicam que o local está desativado. Encontrei um funcionário que me disse ser agente do antigo Caje e que me informou que o local estava em reformas e, à pedido da comunidade, ele estava ali para evitar que o prédio público (quase abandonado) fosse ocupado por usuários de crack. Segundo ele, não há previsão para que o local passe a funcionar, afinal, estamos em "período eleitoral". Pensei, se ainda não há estrutura alguma ali, funcionários, equipamentos, viaturas, nada, se não há atendimento, para quê exatamente há uma placa imensa dizendo que ali se realiza esta atividade? Não seria mais lógico, colocar uma placa informando sobre um serviço público somente quando este de fato estivesse sendo ofertado?
Volto a dizer que estou narrando fatos e o meu olhar como mãe e cidadã sobre esses acontecimentos. Como jornalista, não apurei ainda se o que vi e ouvi dos vários agentes de segurança com quem falei (por telefone e pessoalmente) refletem a realidade para além do que eu estava constatando. Até por que pautas sobre a nossanada mole vida doméstica são sempre complicadas. Mas alguns questionamentos me vieram à mente. Primeiro, me pareceu haver um grau de vulnerabilidade sobre as crianças e adolescentes do DF bem maior do que supomos. Se eu fosse a vítima? Se eu fosse uma adolescente? Se minha família, por algum motivo, não pudesse se deslocar rapidamente até onde eu estava? Se eu tivesse acabado de sofrer um abuso, o atendimento teria sido diferente? Registre-se aqui que meu filho sequer cogitou ligar para o 190, mas talvez instintivamente eles saibam que isso não vai ajudar.
Tenho os pés no chão. Sou carioca e meu marido é paulistano, temos completa clareza do quanto nossas cidades de origem são infinitamente mais violentas do que Brasília. Em São Paulo e no Rio, assaltos cinematográficos à mão armada são (triste) rotina para a população. No DF, sabemos que a situação de violência urbana caminha para esse quadro mesmo ainda não sendo a mesma. E isso é percebido no dia-a-dia, nos vários relatos de assaltos em ônibus, roubos a mão armada, sequestros relâmpagos. São muitas as razões para que uma metrópole chegue a esse quadro, inclusive o próprio crescimento das cidades em torno dela. E nem quero me aprofundar em análises sobre o alarmante relatório do CNJ sobre a população carcerária no Brasil. A Segurança Pública é um tema espinhoso mesmo, com muitas variáveis, começando naquela recorrente (e certeira) tecla em todos os discursos, a tal da educação.
O fato é que hoje eu tive uma estranha sensação, a de que os agentes de segurança podem estar - voluntariamente ou não - nos enviando alguns recados que sim, pressupõem muitas abordagens, até mesmo em razão do momento político que estamos vivendo. Mas exponho aqui esse relato, na tentativa de que a gente possa, como sociedade, pensar sobre essas muitas possibilidades e sobre a parte que nos cabe nesse latifúndio.
PS: vale a pena ouvir a reportagem citada, com outros relatos e dicas de segurança para os estudantes.
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Juliana Medeiros é jornalista.
Volto a dizer que estou narrando fatos e o meu olhar como mãe e cidadã sobre esses acontecimentos. Como jornalista, não apurei ainda se o que vi e ouvi dos vários agentes de segurança com quem falei (por telefone e pessoalmente) refletem a realidade para além do que eu estava constatando. Até por que pautas sobre a nossa
Tenho os pés no chão. Sou carioca e meu marido é paulistano, temos completa clareza do quanto nossas cidades de origem são infinitamente mais violentas do que Brasília. Em São Paulo e no Rio, assaltos cinematográficos à mão armada são (triste) rotina para a população. No DF, sabemos que a situação de violência urbana caminha para esse quadro mesmo ainda não sendo a mesma. E isso é percebido no dia-a-dia, nos vários relatos de assaltos em ônibus, roubos a mão armada, sequestros relâmpagos. São muitas as razões para que uma metrópole chegue a esse quadro, inclusive o próprio crescimento das cidades em torno dela. E nem quero me aprofundar em análises sobre o alarmante relatório do CNJ sobre a população carcerária no Brasil. A Segurança Pública é um tema espinhoso mesmo, com muitas variáveis, começando naquela recorrente (e certeira) tecla em todos os discursos, a tal da educação.
O fato é que hoje eu tive uma estranha sensação, a de que os agentes de segurança podem estar - voluntariamente ou não - nos enviando alguns recados que sim, pressupõem muitas abordagens, até mesmo em razão do momento político que estamos vivendo. Mas exponho aqui esse relato, na tentativa de que a gente possa, como sociedade, pensar sobre essas muitas possibilidades e sobre a parte que nos cabe nesse latifúndio.
PS: vale a pena ouvir a reportagem citada, com outros relatos e dicas de segurança para os estudantes.
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Juliana Medeiros é jornalista.
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