"Se não estás prevenido ante os meios de comunicação, te farão amar o opressor e odiar o oprimido" Malcom X

terça-feira, 14 de abril de 2009

Diálogo na sala de aula de curso superior de jornalismo

Aproveitando o debate atualíssimo - da necessidade ou não de diploma para jornalistas -, relato abaixo um acontecimento do qual fui testemunha, linha por linha, até porque estava anotando cada coisa que estava sendo dita, dado o "inusitado" da situação (pra não dizer surreal). Esse é o perfil do aluno de jornalismo, num nível que nem o Ribondi percebeu quando produziu sua matéria bombástica para a Caros Amigos.


Aluna entra na segunda metade da aula de Jornalismo Político-Econômico (o professor já tinha passado, oralmente, para os outros alunos todos os trabalhos que deveriam ser entregues ao longo do bimestre):

- Professor, o que é que você vai dar para o trabalho do bimestre mesmo?
O professor, pacientemente, começa a responder:
- Eu estava explicando pros alunos que vocês terão que ler o texto...
- Ah, não professor! Ler um texto?.. Não tem outra coisa não? Odeio política!
- Tem esse e um outro que é uma análise de um filme...
- Ai, odeio esses filmes, me dá um sono...
- E vocês terão que entrevistar um parlamentar...
- Ai, professor, pra quê tanta coisa??? Então vai, escreve aí no quadro pra eu anotar porque hoje eu não trouxe nem caderno.
- Então (começa a escrever), como eu estava dizendo...
(Enquanto isso, a aluna conversa com um colega do lado: "não sei pra quê ele pede tanta coisa... você já viu esse filme?", no que o outro responde: "esse professor só pede pra gente ficar lendo sobre política, eu acho isso um saco, e não vou ver esse filme!".. e a aluna cansada de tanto conteúdo retruca "ai, não sei o que é pior, não gosto de ler, não gosto desses filmes...")
O professor se vira apontando para tudo que escreveu no quadro e:
- Até sexta vocês podem me trazer este texto..
- Professor, com 2300 caracteres???? Ah não... eu não gosto de escrever!!!....
- Gente! Digitando no computador, vocês chegam nisso rapidinho!
- Ai que droga - vira-se pro outro - me empresta um papel que eu vou ter que anotar isso.. saco..


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Sempre tive vontade de perguntar pra essa moça se ela tinha idéia mesmo do curso que estava fazendo. Se sabia com certeza o que faz um jornalista...

Outro dia, conversando com meu pai, que também é professor universitário, comentei sobre essas situações (que me deixam um tanto indignada, confesso) e ele me chamou a atenção para uma coisa: "É preciso ter paciência porque eles são vítimas do sistema implantado pela ditadura. As consequências de um regime repressor perduram por gerações, produzindo ao longo dos tempos, pessoas cada vez mais incapazes de pensar."

Lamentavelmente, esse é o maior reflexo do que a ditadura produziu. E esse é o profissional que sai com diploma de Comunicação Social - Jornalismo e, provavelmente, terá garantida sua reserva de mercado.

P.S.: Ah, e, antes que alguém venha jogar pedras sobre a categoria, eu já vi cenas muito, mas muito semelhantes a essas em outros cursos também, incluindo Direito. E, em Brasília, o fenômeno é ainda maior, porque os alunos estudam obrigados pelos pais apenas para obterem um diploma e se prepararem para os concursos públicos, raramente para exercerem a profissão, seja lá do que for.

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