"Se não estás prevenido ante os meios de comunicação, te farão amar o opressor e odiar o oprimido" Malcom X

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Chomsky diz que não vai ser fácil avançar

Do blog Tecedora:


Do La Jornada
Tradução de Denise Queiroz
Colaboração de Sergio Pecci

Fazer uma conferência em Howard Zinn é uma experiência agridoce para mim. Lamento que ele não esteja aqui para participar e revigorar um movimento que seria o sonho de sua vida. Pode-se dizer que ele é o responsável por boa parte dos fundamentos que deram origem a ele.

Se os laços e as associações que estão se estabelecendo nestes notáveis eventos se sustentarem durante o longo e difícil período que os espera – a vitória nunca chega rápido – os protestos do Ocupemos poderão representar um momento significativo da história norte-americana.

Eu nunca vi nada como o movimento Occupy, nem em tamanho nem em caráter, nem aqui nem em outra parte do mundo. As lideranças estão empenhadas em criar comunidades cooperativas que poderão ser as bases para as organizações permanentes que serão necessárias para superar as barreiras - que virão - e a reação contrária - que já está se produzindo.

É apropriado dizer que o este movimento não tem precedentes, pois esta é uma era sem precedentes e não só nestes momentos, senão desde os anos 70 que foram uma época decisiva para os Estados Unidos. Desde que se iniciou o país, tivemos uma sociedade em desenvolvimento, não sempre no melhor sentido, mas como um avanço geral até a industrialização e a riqueza.

Ainda nos períodos mais sombrios, a expectativa era que o progresso tinha que continuar. Minha idade me permite lembrar vagamente a grande depressão. Nos meados dos anos 30. Ainda que objetivamente a situação fosse muito mais dura que hoje, o espírito era bastante diferente. Estava recém se organizando um movimento operário militante – com o Congresso das Organizações Industriais (CIO) e outros- e os trabalhadores organizavam greves com plantões, e estavam a um passo de tomar as fábricas e dirigi-las eles mesmos.

Devidos às pressões populares, foi aprovada a legislação de um novo tratado (New Deal) e a sensação dominante era que sairíamos dos tempos difíceis.


Desesperança e desespero
Agora há uma sensação de desesperança e às vezes de desespero. É algo bastante novo na nossa história. Nos anos 30 os trabalhadores podiam prever que os empregos voltariam. Agora os trabalhadores das manufaturas, com o desemprego praticamente no mesmo nível que durante a grande depressão, sabem que, se continuarem as políticas atuais, esse emprego vai desaparecer para sempre.
Essa mudança na perspectiva norte-americana evoluiu desde os anos 70. É uma mudança de direção, vários séculos de industrialização se converteram em desindustrialização. Claro, a manufatura continuou, mas nos outros países; muito lucrativo para as empresas, mas nocivo para a força de trabalho.
A economia centrou nas finanças. As instituições financeiras se expandiram enormemente. Se acelerou o círculo vicioso entre finanças e política. A riqueza se concentrava cada vez mais no setor financeiro. Os políticos, frente aos altos custos das campanhas, se afundaram mais profundamente nos bolsos de quem os apoiava com dinheiro. E, por sua vez, os políticos os favoreciam com políticas que favoreciam Wall Street: desregulamentação, mudanças fiscais, relaxamento das regras de administração corporativa, o que acabou intensificando o círculo vicioso. O colapso era inevitável. Em 2008 o governo resgatou as empresas de Wall Street, que supostamente, eram grandes demais para quebrar, com dirigentes grandes demais para irem presos.
Agora, para cada um décimo de 1% da população que mais se beneficiou de todos estes anos de cobiça e enganos, tudo está muito bem.

Plutonomia e precariado

Em 2005 o Citigroup – que várias vezes foi objeto de resgate do governo – viu o luxo como uma oportunidade de crescimento. O Banco distribuiu um folheto para os investidores, convidava-os a colocar o seu dinheiro em algo chamado índice de plutonomía, que identificava as ações das companhias que atendem ao mercado do luxo.
O mundo assim se dividiu em dois blocos: a plutonomia e o resto, conforme resumiu o Citigroup. Estados Unidos, Grã-Bretanha e Canadá, segundo a visão do Citybanck, são as plutonomias chave: as economias impulsionadas pelo luxo.
E os não ricos foram chamados de precariado: o proletariado que tem um modo de vida precário na periferia da sociedade. Essa periferia, no entanto, se converteu numa proporção substancial da população tanto dos Estados Unidos quanto de outros países.

Assim temos a plutonomia e o precariado: o 1% e o 99%, como se vê no movimento Occupy. Não como cifras literais, mas como uma imagem acertada.

A mudança histórica da confiança popular no futuro é um reflexo de tendências que poderiam ser irreversíveis. Os protestos do Ocupemos são a primeira reação popular importante que poderiam mudar essa dinâmica.

Ameaças

Centrei nos assuntos internos, mas há dois perigosos fatos na arena internacional que opacam aos demais. Pela primeira vez na história há ameaças reais a sobrevivência da espécie humana. Desde 1945 temos armas nucleares e parece um milagre que tenhamos sobrevivido. Mas as políticas do governo Barack Obama e seus aliados estão fomentando a escalada.
A outra ameaça claro, é a catástrofe ambiental. Por fim praticamente todos os países do mundo estão tomando medidas para fazer algo a respeito, mas Estados Unidos avança para trás.
Um sistema de propaganda, reconhecido abertamente pela comunidade empresarial, declara que o câmbio climático é uma enganação dos setores liberais. Por que deveríamos dar atenção a esses cientistas? Se continuar essa intransigência no país mais rico e poderoso do mundo não poderemos evitar a catástrofe.

Occupy pode ser embrião das mudanças
Deve-se fazer algo de forma disciplinada e sustentável. E pronto. Não vai ser fácil avançar. É inevitável que haja dificuldades e fracassos. Mas, a não ser que o processo que está ocorrendo aqui e em outras partes do país e do mundo continue crescendo e se converta numa força importante da sociedade e da política, serão exíguas as possibilidades de um futuro decente.
Não se podem lançar iniciativas significativas sem uma base popular ampla e ativa. É necessário sair por todo o país e fazer as pessoas entenderem do que se trata o movimento Ocupemos, explicando o que cada um pode fazer e que conseqüências teriam o não fazer nada.
Organizar uma base assim implica educação e ativismo. Educar o povo não significa dizer em quem devem acreditar, significa aprender dele e com ele.

Karl Marx disse: A tarefa não é somente entender o mundo, senão transformá-lo.

Uma variante que convém ter em conta é que, se queremos mudar o mundo, temos que entendê-lo. Isso não significa escutar uma palestra ou ler um livro, se bem que isso ajuda. Se aprende ao participar, se aprende dos outros, se aprende das pessoas a quem queremos organizar. Todos temos que alcançar conhecimentos e experiências para formular e implementar idéias.
O aspecto mais digno de entusiasmo do movimento Ocupemos é a construção de vínculos que está ocorrendo em todas as partes. Se puderem se manter e expandir, o movimento poderá dedicar-se a campanhas destinadas a encaminhar a sociedade para uma trajetória mais humana.

Assista abaixo a primeira parte da palestra de Chomsky no #OccupyBoston:

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