"Se não estás prevenido ante os meios de comunicação, te farão amar o opressor e odiar o oprimido" Malcom X

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Isn´t - Reflexões acerca da Cultura Contemporânea

Cheguei agora há pouco do FIC - Festival Internacional de Cinema de Brasília, onde assisti à uma mostra de curtas, "Cada um com seu cinema", com filmes de países que vão desde o Kamboja à França, Itália, Bolívia... muito bom mesmo. Mas, me chamou a atenção um filme italiano em que um cinéfilo narra sua conversa com o filho tentando demovê-lo da idéia de assistir Matrix para ver um "Felini" ou algo do gênero. O que acontece é que, a partir de alguns "rótulos", as pessoas tendem a achar que qualquer filme "comercial" é ruim. Acho que a coisa não é bem por aí. Eu já vi Matrix (mais de uma vez), todos, apesar de preferir o primeiro. Agora parece piegas, mas quando ele foi lançado, representava uma revolução na maneira de fazer filmes "blockbuster". Matrix foi pensado.

Seu roteiro foi inspirado num livro de J. Baudrillad que versa sobre conceitos abstratos e subjetivos, como "virtual x real", o "caos", o "fim". Ele teoriza sobre a possibilidade de que tudo que estamos vivendo não é real, mas um produto de um software (programa de computador). O real, portanto, segundo Baudrillad seria apenas uma simulação. Isto, tomando o mundo tal como ele é como exemplo, já que não existe quase nada hoje que não tenha sido manipulado de alguma forma pelo homem. Mesmo as florestas em seu estado natural, sofrem as consequências do impacto da nossa presença no planeta. Nosso corpo vem sendo modificado pela ciência na forma de cirurgias plásticas, alimentação e pesquisas genéticas principalmente. Até a morte, ou a tentativa de dribá-la, vem sendo buscada com as pesquisas criogênicas.

Como diz o próprio autor: "não há necessidade de um sujeito do pensamento, de um sujeito da ação, tudo se passa pelo viés de mediações tecnológicas". No mundo "virtual", então, o importante é a informação, os cálculos. A computação do que seria "real", vai tornando o real secundário.

Esses conceitos, na verdade, são também analisados sob a ótica da cultura de massa, do processo pelo qual estamos sendo cada vez mais absorvidos por nossa própria cultura, deixando de perceber quem somos realmente, sem essas "máscaras" de virtualidade. Nossos hábitos, nosso comportamento, nossos valores, são na verdade reflexos da "cultura contemporânea". Quem seríamos nós por trás de tudo isso?

Outra questão importante é o conceito de "fim", ou seja, para onde caminha nossa cultura, a humanidade que ainda existe em nós, dentro de um mundo que valoriza cada vez mais os avanços tecnológicos em detrimento das próprias relações humanas? De certa forma, o filme retrata bem isso no papel do Neal que tem a tarefa de "salvar o mundo real". Por outro lado, alguns personagens confessam preferir o mundo "virtual" com suas "ilusões" de imagens, cores e sabores - numa alusão ao individualismo típico do mundo capitalista.

Conforme Baudrillad, vivemos um momento autofágico em que acabaremos por consumir a nós mesmos. Isso me lembra também que os estudos de Marx sobre o capital, séculos atrás, também previam a falência do modelo capitalista com essa mesma "autofagia". Hoje, estudos científicos já provam que o avanço tecnológico e da predação humana sobre o planeta já é mais veloz que a capacidade da natureza de se recuperar. Mas, segundo Baudrillad, não haveria um término e sim uma "transformação". Para ele "já ultrapassamos o ponto de irreversibilidade", em que tudo se desenvolverá no "vazio", no "infinito".

No limite, antes que tenhamos tempo de perceber qual o propósito da existência humana - dúvida maior de toda a filosofia - perderemos a finalidade de ser. O fim da humanidade seria assim, a "imortalidade virtual", sem que tenhamos conseguido até lá desvendar os mistérios da vida real, da realidade da nossa existência.

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Juliana de Souza

P.S.: inspirado numa pessoa com quem convivi nos últimos seis meses. Inteligente, surpreendente e com humor refinado. Um mestre sem recalques, nem vaidades mesquinhas. Que faz questão de dividir seu conhecimento.... é professor, você está em extinção.

2 comentários:

Homerodf disse...

O tema desse post é muito relevante, mas ele deve ser lido lendo-se também, como contraponto, um livro chamado "Imposturas Intelectuais", de Alan Sokal e Jean Bricmont, da Record. O tema relevante aqui é a possibilidade, ou não, de se conhecer, ou não, a realidade objetiva e sobre ela influir, uma questão que tem profundas implicações filosóficas e políticas.
Homero

Reginaldo Freire disse...

Interessante também o livro de Stuart Hall, "A identidade cultural" na pós-modernidade, que faz uma reflexão desses efeitos da vida "moderna" com toda sua velocidade e virtualidade.

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